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São Paulo, sábado, 05 de abril de 2003

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MEDICINA

Visualização de cânceres em computador pode ajudar cientistas a decifrar os mecanismos de expansão da doença

Equipe faz estudo tridimensional de tumor

Divulgação Carlos Ortiz de Solórzano/Berkeley Lab
Visualização tridimensional de tecido canceroso extraído de glândula mamária em computador


SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Assim como um general distribui suas tropas e faz avanços com mais segurança se souber como seu inimigo está distribuído pelo campo de batalha, um médico pode ter mais chance contra um tumor se visualizar como ele cresce e expande seu domínio. Sob o comando do espanhol Carlos Ortiz de Solórzano, um laboratório nos EUA luta para obter essa vantagem estratégica contra o câncer -um mapa tridimensional de sua invasão dos tecidos.
Esse verdadeiro serviço de inteligência foi obtido combinando microscopia controlada por computador a poderosos programas de visualização em três dimensões. Com ele, os pesquisadores do Berkeley Lab, na Califórnia, esperam ter informações valiosas sobre como o câncer progride.
As imagens obtidas conseguem mostrar até a presença de receptores de hormônios e proteínas. E os cientistas podem girá-las e ampliá-las à vontade, para estudar exatamente o que estão procurando. É quase como reconstruir o câncer, em termos das estruturas celulares do tumor, só que "in silico" (no computador).
"No futuro, poderemos analisar qualquer amostra de tecido tridimensional em sua atividade celular e genética", diz Ortiz de Solórzano. "Vamos relacionar com mais facilidade morfologia [forma" e eventos moleculares."

Segredos do inimigo
O objetivo principal é tentar entender como o câncer pode evoluir de umas poucas células anômalas (que sofreram mutações em seu DNA) a um conjunto de milhões de células cancerosas. Eventualmente, o método também poderia ajudar a elucidar processos degenerativos ligados a outras doenças, como os males de Alzheimer e de Parkinson.
Por ora, todos os estudos estão limitados a câncer mamário. "Todas as nossas linhas de pesquisa são confluentes, já que lidam todas com a biologia normal ou anormal -patológica- da glândula mamária", conta o líder do grupo. "Nosso interesse pela doença é justificado por seu impacto social e clínico e pela plasticidade particular desse órgão, que não completa seu desenvolvimento até a puberdade e está sujeito a processos cíclicos regulados por hormônios."
Atualmente, a principal utilidade da estratégia é estudar como o câncer funciona. "Esperamos contribuir para o entendimento da expansão da doença, principalmente pela concentração no crescimento dentro dos dutos que acontece antes que a doença se torne invasiva", diz Solórzano.
Ao encontrar conexões entre a principal frente da doença e áreas morfologicamente normais, o cientista espera determinar como a moléstia progride, se pela substituição de células nativas que formam as paredes dos dutos mamários, pelo efeito de campo que "transforma" células normais em cancerosas ao serem atingidas pela frente em expansão, ou ainda por meio de outra estratégia.
Isso responde pelo estudo de tumores, que eles fazem a partir de tecidos humanos extraídos por biópsia -a técnica não permite a observação do tecido enquanto ele está vivo e "dentro" da pessoa.
Paralelamente, o grupo estuda a evolução normal das glândulas, essas extraídas de camundongos em diferentes estágios de desenvolvimento. "Usando modelos animais, esperamos ter um entendimento melhor de como a glândula mamária normal se desenvolve, e o papel dos hormônios no processo de evolução."

Uso primário
O uso direto em aplicações médicas ainda está distante, mas o pesquisador espanhol vê isso como possibilidade para o futuro. "Primariamente nosso método só permite concentrar os estudos em áreas de interesse cuidadosamente selecionadas, como por exemplo a periferia de um tumor em expansão, com suas conexões com os tecidos normais", diz.
"Entretanto, se provarmos que uma abordagem completa tridimensional do câncer de mama pode melhorar a precisão do diagnóstico da doença e reduzir o risco de recorrência, então nosso método, ou estratégias similares, podem eventualmente ser incorporados à rotina clínica."
O objetivo imediato de Solórzano é tornar o processo mais rápido. "Nossa principal meta do ponto de vista técnico hoje é automatizar totalmente a reconstrução das estruturas de interesse. Isso nos permitirá acelerar a análise das nossas amostras."
O estudo foi financiado pelo Departamento de Defesa dos EUA e pela Universidade da Califórnia.


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