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CIÊNCIA
Comportamento é desvinculado de genética
RICARDO BONALUME NETO
especial para a Folha
O "amor de mãe" não é algo que
já se nasça sabendo; é algo que se
aprende pelo exemplo e que passa
de geração em geração não porque está escrito no material genético dos seres vivos, mas sim pela
experiência.
Essa descoberta foi feita por
pesquisadores no Canadá e o objeto de estudo foram ratos, não seres humanos.
Mas, apesar disso, o achado tem
implicações na maneira como as
pessoas cuidam das crianças, especialmente nas suas primeiras e
fundamentais semanas de vida.
"Nos seres humanos, contextos
sociais, emocionais e econômicos
influenciam a qualidade do relacionamento entre mãe e filhos e
podem mostrar continuidade
através das gerações", afirmam os
autores da pesquisa.
Os achados estão descritos na
edição de hoje da revista "Science". Os autores são Darlene Francis, Josie Diorio, Dong Liu e Michael J. Meaney, da Universidade
McGill, em Montreal, no Canadá.
"Nossos achados em ratos podem, portanto, ser relevantes na
compreensão da importância de
programas precoces de intervenção em seres humanos", dizem os
pesquisadores.
Por "intervenção" entende-se
alguma forma de cuidado como o
materno -carinho, amamentação e troca de fraldas.
Os experimentos, complexos,
envolveram várias gerações de ratos. Foi necessário um detalhado
controle para evitar que fatores de
origem genética influenciassem
os resultados.
Estudos anteriores com roedores por outros pesquisadores já
demonstraram que poderia haver
mecanismos de transmissão de
comportamentos ligados ao medo entre gerações, que não envolviam diretamente os genes.
"Os resultados do estudo
apóiam essa idéia e sugerem que o
mecanismo para esse padrão de
herança envolva diferenças em
cuidado materno durante a primeira semana de vida", declaram
os autores do estudo.
Os testes de Francis e colaboradores avaliaram a relação entre a
maneira com que as mães cuidaram dos filhotes e o comportamento que estes apresentaram.
Essencialmente, mostrou-se
que os filhotes cujas mães os lambiam e cuidavam com mais frequência, com uma postura específica ao fazê-lo -com as costas
arqueadas-, demonstraram menos medo do que os filhotes com
mães mais "reservadas".
Essa diferença da "personalidade" de ratos poderia ser de origem
genética. Mas os estudos avaliaram filhotes das mães "discretas"
criados pelas mães mais atentas.
Eles desenvolveram comportamentos menos medrosos.
E, ao ter seus filhos, esses antigos filhotes cuidaram da sua prole
de modo mais atencioso, em vez
de mais discreto.
Concluindo: no velho debate
sobre quem mais influencia o
comportamento de um ser vivo, o
fator "meio ambiente" ganhou
um ponto em relação à questão da
hereditariedade.
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