São Paulo, domingo, 06 de abril de 2008

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Carioca busca antimatéria na Suíça

Físico teórico larga o giz para conectar cabos e testar equipamentos eletrônicos em detector do LHC

Inauguração do acelerador europeu está prevista para junho, após uma série de atrasos; no total, 34 países participam do projeto

DO ENVIADO A GENEBRA

Envolvendo 34 países, oficialmente, e com dezenas de outras nações colaboradoras, a construção do acelerador de partículas LHC transformou o Cern numa torre de Babel. Apesar de os funcionários dos refeitórios só falarem francês, no resto do centro de pesquisa o inglês funciona como língua franca. E promover o diálogo correto entre as "línguas técnicas" de teóricos, experimentalistas e engenheiros também não foi uma coisa trivial.
O clima nos centros de experimentos às vésperas da inauguração do acelerador de partículas -prevista para junho, finalmente, após uma série de atrasos- é de otimismo, e muitos cientistas levam de lá a experiência de interagir com modos de pensar diferentes.
É o caso do estudante de física Rafael Coutinho, da PUC-RJ, que termina nesta semana um estágio de três meses no LHCb, um dos grandes detectores do LHC. Com toda sua formação voltada para física teórica, o universitário está à véspera de se formar com um diferencial: a oportunidade de pôr a mão na massa.
Por sugestão de sua orientadora, Carla Gödel, Coutinho "largou o giz" por três meses e aceitou um estágio no qual aprendeu como funciona a eletrônica do detector, ajudando a completar tarefas rotineiras -checar cabos e conexões e testar equipamento eletrônico altamente especializado.
"Cheguei aqui meio assustado e preocupado por não ter conhecimento quase nenhum em física experimental", conta. "É bom ver como os dados que eu estudo são gerados. Se alguém perguntar agora "Sabe de onde veio esse dado?", eu vou responder "Sei, eu participei disso"."

Bombas de antimatéria
No Brasil, Coutinho trabalha com um problema teórico que chamado "violação da paridade de carga". O nome técnico esconde a natureza de uma entidade que fascina muitos: a antimatéria -uma matéria igual à que conhecemos, mas com cargas elétricas invertidas.
Quando se encontram, matéria e antimatéria se aniquilam, gerando grande energia. Décadas atrás, essa propriedade fascinou tanto autores de ficção científica quanto militares, mas hoje ninguém especula mais sobre "bombas de antimatéria" ou coisa do tipo.
Cosmólogos afirmam que o Big Bang, a explosão primordial do Universo, gerou um bocado de antimatéria. Hoje contudo, ela não existe, e não se pode dizer que tenha sido aniquilada pela matéria, já que esta outra sobrou para contar a história.
No LHCb, experimentos são projetados para descobrir como, quando e por que a antimatéria decai mais rápido do que a matéria. Isso -a tal violação de paridade- pode ter tido conseqüências na maneira como o Universo evoluiu.
Se os teóricos podem se interessar pela prática, o contrário também é verdade, em alguns casos. O engenheiro eletrônico brasileiro Rafael Nóbrega, por exemplo, começou a estudar a física da paridade de cargas para seu doutorado na Universidade de Roma, que envolve o desenvolvimento de instrumentos científicos para o LHCb. "Mas ainda sou mais engenheiro do que físico", diz.
Parte da eletrônica do detector tem também a assinatura de outros brasileiros, "Três teses de mestrado de alunos brasileiros já foram completas em assuntos associados à construção e à física a ser feita com este experimento", diz o físico Arthur Maciel, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. (RG)


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