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CÉREBRO
Brasileiros em universidades dos EUA querem reverter fuga de cientistas com instituto de pesquisa de ponta em Natal
Grupo propõe centro de excelência no RN
CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA
O que você faria se fosse um pesquisador brasileiro bem-sucedido
numa área de ponta, ocupando
um cargo numa universidade dos
EUA, com financiamento garantido para suas pesquisas e vários
trabalhos publicados em revistas
como "Science" e "Nature"? Um
trio de neurocientistas nessa situação tem a resposta: largar tudo
e ir para o Rio Grande do Norte.
Os três brasileiros -Miguel Nicolelis e Sidarta Ribeiro, da Duke
University, e Cláudio Mello, da
Oregon Health and Science University- propuseram ao Ministério da Ciência e Tecnologia a
criação de um instituto internacional de neurociências em Natal.
O instituto serviria como um
centro de excelência de pesquisa,
para formação de neurocientistas
no Brasil, para atração de pesquisadores estrangeiros e para trazer
de volta cientistas brasileiros que
hoje estão no exterior.
Segundo a Capes (Coordenação
de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Nível Superior), 10% dos pesquisadores brasileiros que saem
não voltam. Um estudo do atual
secretário de Ciência e Tecnologia
do Ministério da Saúde, Reinaldo
Guimarães, mostra que, de 1993 a
1999, o Brasil perdeu 966 cientistas -60% deles para os EUA.
"A idéia é descentralizar a produção científica, que está concentrada no Sul e no Sudeste", disse à
Folha Nicolelis, 42, radicado nos
Estados Unidos há 15 anos.
Além disso, afirma o pesquisador, o instituto inauguraria um
modelo de financiamento à pesquisa no Brasil que fez dos EUA a
maior potência científica do planeta: a captação de doações de
pessoas físicas, aliada a dinheiro
de fundações internacionais. "Poderíamos dar um "bypass" [contornar] na estrutura universitária
tradicional brasileira."
Apesar de não dizer quanto custariam a montagem e o funcionamento do projeto, Nicolelis afirma que existem fundações estrangeiras -como a MacArthur e a
Pew, dos EUA, e a Human Frontiers, do Japão- que poderiam
aplicar recursos no instituto, que
ele espera ver em atividade nos
próximos três anos.
"Quando o dinheiro começar a
fluir de fora do Brasil", afirma o
cientista, será possível sentar com
a aristocracia brasileira e "convencê-la de que não dá para ter
crescimento econômico sem investir em educação e ciência".
Pelo menos um neurocientista
ganhador do Prêmio Nobel já teria aceitado participar do comitê
gestor do instituto.
"Brasília" científica
O centro de neurociência funcionaria no campus da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, com a qual já haveria negociações adiantadas. Um simpósio
internacional de neurociência está sendo organizado para o ano
que vem na cidade.
Segundo Nicolelis, a escolha da
capital potiguar teve vários objetivos: primeiro, criar um pólo de
ciência de ponta numa Unidade
da Federação sem tradição de investimento em pesquisa e sem
uma economia comparável à dos
Estados do Sudeste. "Queremos
fazer uma Brasília científica", afirma Nicolelis, em alusão à capital
que foi construída do nada no
meio do cerrado -aliás, Mello e
Ribeiro são brasilienses.
"Se [o modelo] funcionar lá, vai
funcionar em qualquer lugar do
Brasil", afirma o cientista. "Aí, poderemos ter um pólo de física experimental em Belém e de doenças tropicais em Porto Velho."
Depois, Natal tem algo mais a
oferecer à neurociência do que
praias e dunas: a UFRN possui
um dos melhores centros de primatologia do país. E os macacos,
parentes mais próximos do homem, são indispensáveis para
compreender como funciona o
cérebro humano. Nos países desenvolvidos, a importação e a manutenção dos animais pelos centros de pesquisa é muito cara,
além de enfrentar oposição de
ONGs de direitos dos animais.
Por fim, claro, há as dunas e
praias. Pesquisadores estrangeiros poderiam vir para Natal, fazer
ciência de qualidade e "morar
num dos lugares mais maravilhosos do mundo", diz Nicolelis.
O grupo, que se disse inspirado
pela eleição de Lula, pretende ainda integrar ao centro de pesquisa
uma escola para 300 crianças,
com ênfase no ensino de ciências,
e um centro de referência em saúde mental, para traçar o perfil epidemiológico das doenças mentais
no Estado. "Depois de novembro,
percebemos que está na hora de o
Brasil ser feito", disse Nicolelis.
"Seria excelente se o nosso primeiro Nobel viesse de Natal."
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