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Seis graus de separação
Livro elucida as propriedades das redes que unem atores de Hollywood, sites da web,
epidemias e proteínas
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
Entre a multidão de
inutilidades divertidas que a internet oferece, uma das mais
tradicionais é o Oráculo de Bacon (oracleofbacon.org), um jeito de calcular a
distância média entre quaisquer atores de Hollywood, inspirado na lenda urbana de que
Kevin Bacon seria o astro mais
conectado do cinema americano. Criou-se até o conceito de
"número de Bacon". Val Kilmer, por exemplo, tem um número de Bacon igual a 2, já que
atuou com Tom Cruise em
"Top Gun", e Cruise, por sua
vez, já fez filmes com Bacon.
Mais significativo, porém, é o
fato de até o genial matemático
húngaro Paul Erdós (1913-1996) ter número de Bacon 4,
por causa de um documentário
sobre sua vida.
Erdós, como explica seu conterrâneo Albert-László Barabási no livro "Linked", pode ser
considerado o fundador da
análise científica das redes sociais, o mesmo campo que inspirou a brincadeira do Oráculo
de Bacon. Embora lançada com
atraso no Brasil (o original de
"Linked" chegou ao público de
língua inglesa em 2002), a obra
ainda é uma introdução valiosa
às estranhas propriedades
compartilhadas por fenômenos díspares do mundo humano e natural, como o conjunto
de atores de Hollywood, os sítios da internet, epidemias virais e proteínas de uma célula.
Sem escala
Todos esses conjuntos de interações podem ser classificados debaixo da rubrica de redes
sem escala, propõe Barabási,
hoje diretor do Centro de Ciência de Redes da Universidade
Northeastern (EUA). Para o físico de origem húngara, formar
redes sem escala é uma espécie
de compulsão do Universo
quando se trata de organizar
sistemas complexos.
O conceito se inspira, em
parte, na divertida ideia dos
"seis graus de separação", a
qual postula que, em média,
qualquer pessoa do planeta está em contato com qualquer
outra com a ajuda de seis intermediários. (Na verdade, o experimento original dos seis graus,
bolado por Stanley Milgram
nos anos 1960, foi feito só dentro do território dos EUA.)
Redes sem escala, portanto,
são "mundos pequenos": a conexão entre cada um de seus
elementos é relativamente estreita (a distância média entre
proteínas que participam do
metabolismo da célula é de
apenas três graus, enquanto a
que separava sites da internet
no fim dos anos 1990 era de 19
graus, muito menos do que o
esperado se as conexões acontecessem de forma aleatória).
Mais importante ainda é a característica que as torna "sem
escala". Muitos elementos da
natureza (como a variação de
altura entre seres humanos,
por exemplo), seguem a chamada distribuição normal, formando uma curva em forma de
sino, se forem representados
num gráfico. O motivo disso é
simples: a maioria das pessoas
tem estatura média, enquanto
só uns poucos indivíduos são
gigantes do basquete ou anões.
Já as redes sem escala apresentam uma distribuição de lei
de potência: um número bem
pequeno de seus elementos são
altamente conectados, formando os chamados "hubs", enquanto a grande maioria tem
uma quantidade modesta de
conexões. Como não existe um
único elemento que seja representativo das conexões de todos os outros elementos, essa
rede não tem uma escala típica
de conectividade -daí o termo
"sem escala". Barabási e seus
colegas foram os primeiros a
aplicar o conceito à internet e
aos sistemas biológicos, entre
outros fenômenos. E, quando
se olha todos esses sistemas em
busca de propriedades gerais,
sua natureza sem escala fica patente, afirma ele.
Na jugular
As características intrínsecas
das redes sem escala estão diretamente ligadas tanto à força
quanto à fraqueza delas, aposta
Barabási. Justamente por causa da importância dos "hubs" é
tremendamente difícil atacar o
funcionamento global da internet derrubando roteadores um
a um, ao acaso. Por outro lado,
ataques cirúrgicos a um número relativamente pequeno de
"hubs" seriam suficientes para
causar muito estrago.
Da mesma maneira, doenças
sexualmente transmissíveis,
como a Aids, talvez dependam
de relativamente poucos indivíduos de libido exacerbada e
sex appeal idem para avançarem de forma sustentada numa
população. Identificar esses indivíduos e vaciná-los seria, dessa forma, o caminho mais curto
para matar uma epidemia em
seu nascedouro.
Esses exemplos, embora intrigantes, deixam certa sensação de "quero mais" na cabeça
do leitor, talvez porque ainda
falte muito para o entendimento completo das redes sem escala, um programa de pesquisa
que segue a todo vapor. De
qualquer forma, já é um caminho que leva os viajantes bem
além de Kevin Bacon.
LIVRO - "Linked - A Nova Ciência dos
Networks"
de Albert-László Barabási
Leopardo, 256 págs., R$ 49,00
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