São Paulo, Domingo, 07 de Fevereiro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PERISCÓPIO

Manuscritos mostram Pitágoras como o primeiro experimentalista

JOSÉ REIS
especial para a Folha

Baseado em textos de Boécio, Andrew Dimarogonas, professor de engenharia mecânica na Universidade Washington, sustenta que Pitágoras introduziu o método experimental e em sua casa estabeleceu o primeiro laboratório científico conhecido ("Journal of Sound and Vibration").
Não é novidade, aliás, que Pitágoras, além de matemático, astrônomo e filósofo, estudou a vibração das cordas e colunas de ar. Isso consta de suas biografias. Mas Dimarogonas dá ênfase especial às experiências que o grego realizou com sinos, malhos, bigornas e cordas vibrantes.
Pitágoras nasceu em Samos, em cerca de 572 a.C., e morreu em Metapontium, em cerca de 497 a.C. Fundou a chamada escola pitagórica de filosofia natural. Não deixou escritos, mas suas lições foram guardadas pelos discípulos. E, como estes depois se separaram em seitas, o pensamento pitagórico em muitos assuntos nem sempre parece coerente. Segundo a tradição, o filósofo viajou extensamente pelo Oriente Médio, onde hauriu muitos conhecimentos dos egípcios e babilônios. Político, deixou Samos por Croton porque se opunha ao tirano Polícrates. Ali criou uma espécie de irmandade que exerceu considerável influência política nas cidades gregas do sul da Itália, mas acabou despertando forte oposição de alguns setores, o que o levou a se mudar para Metapontium, enquanto vários de seus adeptos buscavam outros centros. A irmandade por ele criada era política, religiosa e científica. Pitágoras é, em geral, considerado fundador da teoria dos números, além de haver estabelecido o ideal da geometria como sequência lógica de proposições.
Boécio, filósofo romano (480-524), pode ter tido a oportunidade de compulsar depoimentos de contemporâneos de Pitágoras que hoje se acham perdidos. Suas narrações são confirmadas por outros autores. Conta ele que, certa vez, Pitágoras passava por uma oficina de ferreiro quando notou que os malhos dos trabalhadores emitiam sons de altura diferente. Imaginou que isso pudesse depender da força de cada ferreiro e pediu que eles trocassem seus instrumentos. Observou que continuavam a vibrar com a mesma altura, apesar de acionados por outros braços.
Em casa, o filósofo-cientista realizou outros ensaios, usando sinos, lâminas, cordas e vasos de cerâmica, além de construir um monocórdio para acompanhar as pesquisas sobre altura das vibrações. É essa coleção de objetos que Dimarogonas chama primeiro laboratório científico.
Das observações feitas, Pitágoras concluiu que a altura em que um objeto vibra e, portanto, sua frequência não dependem da força com que ele é tratado, mas de suas propriedades intrínsecas (composição, tamanho, peso, comprimento e, nas cordas, tensão.) Galileu redescobriu esses princípios 2.000 anos mais tarde.
Pitágoras notou a existência de uma relação matemática entre as notas da escala musical e o comprimento das cordas ou das colunas de ar em vibração. Uma coluna de ar ou uma corda de determinado comprimento dava uma nota, mas, se reduzida à metade, daria uma oitava acima. A relação de comprimento de 2 para 3 correspondia ao intervalo musical conhecido como quinta, e a relação 3 para 4 dava a quarta.
Afirma Dimarogonas que sua pesquisa nos escritos de Boécio lhe ensinou que quase toda descoberta científica tem alguma precedente. E cita o próprio teorema que leva o nome de Pitágoras (o quadrado da hipotenusa...), que já era séculos antes aplicado pelos babilônios.


Texto Anterior: Doença afeta 18 países
Próximo Texto: Futuro: De olho na Terra
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.