São Paulo, segunda-feira, 08 de janeiro de 2007

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Matéria escura determina a estrutura do Universo

Tipo misterioso de partícula é invisível e só interage por meio de sua gravidade

Físicos usaram técnica de observação indireta para mapear a distribuição desse tipo de matéria; forma vista é como a de uma esponja

RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Ela compõe 80% da massa do Universo e cientistas acabam de mostrar que é ela quem determina a estrutura do cosmo. A entidade batizada pelos físicos de "matéria escura" é hoje um dos principais mistérios da ciência. Ninguém sabe ainda dizer o que ela é, mas um mapa feito a partir de imagens do Telescópio Espacial Hubble começa a revelar onde ela está.
Teóricos já tinham previsto que a matéria escura é quem determina a estrutura geral do Universo. Ela forma uma espécie de "esqueleto" em torno do qual se agrupa a matéria convencional, a "carne" que forma as galáxias. Agora, o mapa de uma região do céu na constelação do Sextante, perto do Leão, demonstrou isso.
Os astrofísicos envolvidos no projeto ficaram entusiasmados ao descobrir que teoria e observação estão de acordo. "O aspecto mais surpreendente do nosso mapa é o quão previsível ele é", disse à Folha Richard Massey, astrônomo do Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia) e líder do projeto.
A matéria escura recebe esse nome porque, ao contrário da matéria visível -os átomos que formam estrelas, planetas e pessoas-, ela não emite luz nem nenhuma outra forma de radiação. A única forma de detectá-la é por meio de sua força gravitacional, que atrai a luz emitida pela matéria comum e deforma as imagens das galáxias.

Esponja cósmica
O mapa de Massey revelou a maneira com que a matéria escura se distribui numa região do céu de tamanho nove vezes o diâmetro da Lua, vista da Terra.
"Há uma série de filamentos finos e longos que apontam em direções aleatórias e se cruzam em aglomerados de galáxias com grande massa; entre esses há vastos espaços vazios", explica Massey. Ou, para simplificar: "É mais ou menos como uma esponja".
O mapa de Massey foi feito com base em imagens do projeto Cosmic Evolution Survey, um levantamento de imagens ultradetalhadas daquela região do espaço. Foi a maior empreitada da história do Hubble, consumindo 10% do tempo de trabalho do telescópio durante dois anos. O mapeamento está descrito em estudo publicado hoje no site da revista "Nature" (www.nature.com).
Ao final do trabalho, ficou claro que a estrutura "esponjosa" com que a matéria escura se distribuiu fornece a base para estruturar a matéria convencional também. Após o Big Bang, a explosão que deu início ao universo, o esqueleto de matéria escura é que se formou primeiro. "Depois, então, a matéria convencional fluiu para a estrutura de matéria escura e começou a formar estrelas, galáxias e planetas", diz Massey.
Na opinião do cosmólogo Eric Linder, que comenta o trabalho de Massey em outro artigo na "Nature", o mapa é um passo crucial para se compreender a natureza da matéria escura, mas é uma técnica que precisa ser aprimorada. "Ela está ainda nos seus primórdios, e ruídos espúrios afetam traços mais fracos do mapa", diz.

Diferenças reveladoras
Apesar do entusiasmo com a confirmação de teorias, Massey diz que são as anomalias que podem revelar algo novo. "A física interessante está em detalhes, como as poucas discrepâncias entre a distribuição de matéria escura e visível", afirma. "Pretendemos estudá-las em mais profundidade nos próximos meses."
Mesmo com todo avanço, afinal, ninguém ainda sabe o que é a matéria escura, que não é feita de átomos comuns. Para descobrir isso, será preciso olhar tanto para o céu quanto para a Terra. "Aceleradores de partículas esperam poder achar a partícula da matéria escura", diz Massey, com ar otimista.


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