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OBESIDADE
Estudo prova efeito de substância produzida no intestino sobre região de controle de saciedade no cérebro
Hormônio corta a ingestão de calorias
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Quem vive em guerra com a balança já deve ter sonhado com algo similar a uma substância que
reduza em um terço a ingestão de
calorias durante as refeições, mas
produzida pelo organismo e sem
efeitos colaterais. Boa notícia: é
exatamente isso o que faz o hormônio PYY3-36, cuja função foi elucidada por cientistas britânicos.
O lado ruim, como sempre, está
nos detalhes: por enquanto, os interessados em usar os bons serviços do hormônio teriam de se
submeter a uma injeção a cada 12
horas, depois das quais ele perde a
capacidade de frear o apetite.
Mesmo assim, o PYY3-36 deve
inspirar novas formas de combater a obesidade, uma epidemia
mundial: 10% dos brasileiros e
15% dos norte-americanos sofrem com o problema, de acordo
com a Organização Mundial da
Saúde (OMS). E, ao contrário de
outras promessas, o hormônio já
provou sua eficácia em humanos.
A molécula é uma velha conhecida do endocrinologista inglês
Stephen Bloom, do Imperial College London, que trabalha com
ela desde 1984. "Nós mostramos
que ela retarda o esvaziamento do
estômago", disse Bloom à Folha.
Foi só com o estudo publicado
hoje pela revista científica "Nature" (www.nature.com), porém,
que Bloom e seus colegas mostraram a ligação entre ela e a vontade
de encher o prato para comer.
A suspeita de um elo entre uma
coisa e outra surgiu porque o hormônio é fabricado a todo vapor
por células do cólon (os dois terços finais do intestino grosso) nas
horas entre as refeições.
Ao investigar a estrutura molecular do PYY3-36, os pesquisadores
viram que ele lembrava muito os
NPY (neuropeptídeos Y), um
grupo de substâncias produzidas
no hipotálamo (região na base do
cérebro que ajuda a controlar a
sensação de fome).
Os pesquisadores investigaram
os neurônios da região e notaram
que os NPY, mensageiros químicos que costumam incentivar o
sujeito a continuar comendo, tinham sua produção muito diminuída (veja quadro acima).
As moléculas do hormônio, carregadas pelo sangue, se encaixavam com precisão no Y2R -um
receptor neural (tipo de fechadura química) que, quando ligado,
diz aos neurônios do hipotálamo
que o organismo já está saciado.
Seis homens e seis mulheres
saudáveis, com idade média de 28
anos, receberam alternadamente
doses da molécula ou de uma solução inócua e foram levados a
um bufê completo e instruídos a
comer à vontade.
Funcionou: nas 24 horas seguintes, quem recebeu o hormônio ingeriu 33% menos calorias.
Tudo ótimo, sem dúvida, mas o
caminho entre o laboratório e a
prateleira será longo, diz Bloom.
"Enquanto o hormônio natural só
entra no cérebro pelo lugar certo,
uma droga provavelmente penetraria o cérebro inteiro e agiria sobre os receptores de formas não ligadas ao apetite -ou seja, efeitos colaterais", diz o britânico.
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