São Paulo, quinta-feira, 08 de agosto de 2002

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OBESIDADE

Estudo prova efeito de substância produzida no intestino sobre região de controle de saciedade no cérebro

Hormônio corta a ingestão de calorias

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Quem vive em guerra com a balança já deve ter sonhado com algo similar a uma substância que reduza em um terço a ingestão de calorias durante as refeições, mas produzida pelo organismo e sem efeitos colaterais. Boa notícia: é exatamente isso o que faz o hormônio PYY3-36, cuja função foi elucidada por cientistas britânicos.
O lado ruim, como sempre, está nos detalhes: por enquanto, os interessados em usar os bons serviços do hormônio teriam de se submeter a uma injeção a cada 12 horas, depois das quais ele perde a capacidade de frear o apetite.
Mesmo assim, o PYY3-36 deve inspirar novas formas de combater a obesidade, uma epidemia mundial: 10% dos brasileiros e 15% dos norte-americanos sofrem com o problema, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). E, ao contrário de outras promessas, o hormônio já provou sua eficácia em humanos.
A molécula é uma velha conhecida do endocrinologista inglês Stephen Bloom, do Imperial College London, que trabalha com ela desde 1984. "Nós mostramos que ela retarda o esvaziamento do estômago", disse Bloom à Folha.
Foi só com o estudo publicado hoje pela revista científica "Nature" (www.nature.com), porém, que Bloom e seus colegas mostraram a ligação entre ela e a vontade de encher o prato para comer.
A suspeita de um elo entre uma coisa e outra surgiu porque o hormônio é fabricado a todo vapor por células do cólon (os dois terços finais do intestino grosso) nas horas entre as refeições.
Ao investigar a estrutura molecular do PYY3-36, os pesquisadores viram que ele lembrava muito os NPY (neuropeptídeos Y), um grupo de substâncias produzidas no hipotálamo (região na base do cérebro que ajuda a controlar a sensação de fome).
Os pesquisadores investigaram os neurônios da região e notaram que os NPY, mensageiros químicos que costumam incentivar o sujeito a continuar comendo, tinham sua produção muito diminuída (veja quadro acima).
As moléculas do hormônio, carregadas pelo sangue, se encaixavam com precisão no Y2R -um receptor neural (tipo de fechadura química) que, quando ligado, diz aos neurônios do hipotálamo que o organismo já está saciado.
Seis homens e seis mulheres saudáveis, com idade média de 28 anos, receberam alternadamente doses da molécula ou de uma solução inócua e foram levados a um bufê completo e instruídos a comer à vontade.
Funcionou: nas 24 horas seguintes, quem recebeu o hormônio ingeriu 33% menos calorias.
Tudo ótimo, sem dúvida, mas o caminho entre o laboratório e a prateleira será longo, diz Bloom. "Enquanto o hormônio natural só entra no cérebro pelo lugar certo, uma droga provavelmente penetraria o cérebro inteiro e agiria sobre os receptores de formas não ligadas ao apetite -ou seja, efeitos colaterais", diz o britânico.



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