São Paulo, quarta-feira, 08 de outubro de 2008

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Origem da matéria dá Nobel a japoneses

Trabalhos sobre a chamada quebra de simetria, feitos a partir dos anos 1960, ajudam a explicar por que tudo existe

Yoichiro Nambu, radicado nos EUA, ficará com metade do prêmio; a outra metade irá para Toshihide Maskawa e para Makoto Kobayashi

EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL

IGOR ZOLNERKEVIC
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Um trio de origem japonesa ganhou ontem o Prêmio Nobel de Física por seus trabalhos que ajudam simplesmente a explicar por que tudo existe.
Se uma tal de "quebra de simetria", estudada pelos laureados, não tivesse acontecido no início do Universo, toda a matéria teria sido aniquilada pela sua irmã gêmea "do mal", a antimatéria.
O japonês naturalizado americano Yoichiro Nambu, 87, que está desde 1952 na Universidade de Chicago, vai receber US$ 700 mil pelo Nobel. Em 1960, Nambu inventou o conceito de "quebra de simetria".
Makoto Kobayashi, 64, que trabalha no acelerador de alta energia KEK em Tsukuba, Japão, e Toshihide Maskawa, 68, da Universidade Kyoto, ganharão US$ 350 mil cada.
Dois trabalhos de Nambu, em 1961, contribuíram de forma decisiva para o surgimento do chamado Modelo Padrão, que consolida todo o conhecimento que os físicos têm sobre as partículas elementares.
A única peça faltante no Modelo Padrão é o chamado bóson de Higgs, que dá uma massa diferente para cada uma das partículas, justamente por uma "quebra de simetria".
O físico brasileiro Rogério Rosenfeld, do Instituto de Física Teórica da Unesp (Universidade Estadual Paulista), explica a quebra de simetria imaginando um chapéu mexicano. "Imagine que sobre o cocuruto do chapéu exista um animal. A aba, neste caso, forma um extenso vale onde existe comida. Em tese, ele pode escolher qualquer direção mas, ao fazer isso, estará quebrada a simetria. Ele poderia ter ido tanto para a esquerda quanto para a direita", explica.
Rosenfeld contou com a presença de Nambu na sua banca de doutorado, em 1990, na Universidade de Chicago.
Kobayashi e Maskawa levaram o Nobel por descobrirem a quebra de simetria que fez a matéria sobrepujar a antimatéria no Big Bang.
"Eu não esperava ganhar. É uma honra receber o prêmio pelo meu trabalho tanto tempo depois", afirmou Kobayashi logo após o resultado ter sido divulgado, ontem de manhã. "Estava apenas perseguindo meu interesse [acadêmico]."
Em 1972, Kobayashi e Maskawa usaram o conceito de quebra de simetria para explicar o comportamento estranho de uma partícula chamada kaon, observada em 1964. O problema, explica o físico da Unesp, é que para o modelo deles fazer sentido deveria haver três quarks a mais do que os conhecidos na época, o "up", o "down" e o "estranho". Os quarks são partículas do núcleo do átomo que são os menores constituintes da matéria.
"O modelo deles foi ignorado na época", conta o físico Gustavo Burdman, da USP. "A explicação que estava na moda era outra, que foi provada errada."

Explosão de quarks
Todos os físicos, porém, logo reconheceram a explicação de Kobayashi e Maskawa como a correta quando os quarks que eles previram ("charme", "bottom" e "top") foram descobertos, em 1974, 1977 e 1994.
Além de explicar o kaon, a proposta da dupla sobre a quebra de simetria relacionada às cargas dos pares de partículas e antipartículas explica a própria existência da matéria.
No momento do Big Bang, se toda a matéria tivesse sido aniquilada pela antimatéria, só teríamos a radiação. A sorte, talvez, é que houve um pequeno desvio da ordem de uma partícula de matéria para cada 10 bilhões de partículas de antimatéria. "O desbalanço é grande, mas os parâmetros que levaram a essa assimetria são pequenos", diz Rosenfeld. Exatamente a explicação de parte dessa assimetria é que rendeu o Nobel à dupla japonesa.
Em 2001 e 2002, aceleradores de partículas nos EUA e no Japão -o mesmo onde Kobayashi trabalha-, confirmaram a sutil diferença entre matéria e antimatéria em partículas chamadas mésons B.
Maskawa disse que, como cientista, não estava tão emocionado com o prêmio. "O Nobel é uma coisa bem mundana."

Com agências internacionais



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