|
Próximo Texto | Índice
FÍSICA
Novo método deve permitir a fabricação industrial de carbono magnetizado; uso varia da aeronáutica à medicina
Pesquisadores produzem imã de grafite
CRISTINA AMORIM
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O grafite, material comum nas
mochilas dos estudantes, deve ganhar novas aplicações comerciais
graças a um experimento idealizado por pesquisadores do Brasil
e do Uruguai.
A equipe, formada por cientistas dos laboratórios de Física da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no interior de São
Paulo, e da Universidade da República, em Montevidéu, produziu em laboratório carbono magnetizado em escala macroscópica
- pedaços visíveis de imã de grafite- por meio de um método
mais barato e simples do que o
usado normalmente.
O magnetismo é um dos fenômenos mais utilizados por indústrias como a das telecomunicações. "Eu não falaria com você
neste momento se os imãs não
existissem", explicou à Folha, por
telefone, o engenheiro de materiais Fernando Araújo-Moreira,
um uruguaio que mora no Brasil
há 22 anos e trabalha na UFSCar.
Araújo-Moreira e seus conterrâneos Helena Pardo e Álvaro
Mombrú colocaram dois recipientes, chamados de cadinhos
(uma espécie de recipiente resistente ao calor), dentro de um "forno": um continha pó de grafite
puro; o outro, óxido de cobre. O
forno foi preenchido com nitrogênio e mantido aquecido a
1.200ºC por 24 horas, até que o
óxido, em estado gasoso, atacasse
o grafite.
O resultado são pequenas cavidades na estrutura do mineral pelas quais passam correntes eletrônicas. "Imagine que a estrutura
do grafite é parecida com folhas
de papel sobrepostas. O que fizemos foi criar defeitos que atravessam essas folhas", diz Araújo-Moreira. Ele admite que o imã obtido
contém impurezas ferromagnéticas, mas o índice presente seria
incapaz de produzir o efeito observado no carbono.
O novo imã consegue se manter
estável em temperatura ambiente,
algo que os magnetos anteriores
obtidos a partir do carbono não
faziam -normalmente o magnetismo estável, em sistemas orgânicos, é observado apenas em temperaturas muito baixas.
O carbono magnetizado não é
exatamente uma novidade na comunidade científica. Acontece
que as tentativas feitas até hoje
eram pouco eficientes ou caras.
Potencial
Tradicionalmente, o mercado
consome imãs de ligas metálicas
com samário, níquel, ferro e cobalto. A substituição desses elementos pelo grafite, mais leve, impactaria áreas tão distintas quanto informática, aeronáutica, sistemas de comunicação e nanotecnologia. Até estações espaciais seriam beneficiadas. Além disso, o
carbono está presente em todos
os materiais orgânicos, o que em
teoria permite sua aplicação na
medicina. "Há trabalhos que prevêem o uso de micropartículas de
carbono magnetizado para tratar
doenças", comenta o físico Yakov
Kopelevich, que pesquisou o material na Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp).
Antes, a técnica desenvolvida
por Araújo-Moreira e colegas
precisa ser comprovada por laboratórios independentes. Atualmente, ela passa pela avaliação de
duas publicações tradicionais do
meio, "Physical Review Letters" e
"Applied Physics Letters".
"Um fato é produzir o material,
outro é aferir quão magnético ele
é", diz o físico Edgar Dutra Zanotto, também pesquisador da UFSCar. Para ele, o método pode levar
a produção de carbono magnetizado em larga escala, caso seja
provado que é efetivo. O custo do
trabalho é tão baixo que os pesquisadores não buscaram financiamento externo: usaram materiais e equipamentos encontrados
nas duas universidades.
A equipe entrou em junho com
um pedido de patente no Instituto
Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). De acordo com Araújo-Moreira, duas multinacionais
-cujos nomes ele prefere não revelar- mostraram interesse no
procedimento, além de empresas
da Alemanha, França e Estados
Unidos. Novas patentes "filhotes"
devem ser geradas após a aprovação do método.
Por causa das possíveis implicações comerciais, um valor não foi
calculado. "O que mostramos é
apenas a ponta do iceberg", diz
Araújo-Moreira.
Próximo Texto: Panorâmica - Acordo: Ministérios do Turismo e do Meio Ambiente assinam em SP agenda bilateral inédita Índice
|