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ASTRONOMIA
Observação feita na América do Sul mostra urgência de mandar sonda ao planeta, afirmam astrônomos
Resfriamento pode congelar atmosfera de Plutão, diz grupo
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
O envio de uma sonda a Plutão
parece ser mesmo uma corrida
contra o relógio. Dois grupos de
astrônomos, um da França e outro dos EUA, conseguiram observar a atmosfera do planeta e concluíram que ela está mudando.
A equipe americana está mais
convencida disso do que a francesa. Mas ambas detectaram certas
discrepâncias entre os dados
atuais e os obtidos quando a atmosfera plutoniana foi observada
pela primeira vez, há 14 anos.
Os resultados confirmam o temor da comunidade científica de
que é preciso mandar uma nave a
Plutão o mais rápido possível, para observar a atmosfera antes que
ela entre em colapso e congele,
conforme o planeta se afasta do
Sol. Plutão tem a órbita mais
achatada de todos os planetas
-em sua aproximação máxima,
em 1989, ele chegou a estar mais
próximo do Sol que Netuno, o oitavo planeta do sistema.
A observação da atmosfera de
Plutão depende de circunstâncias
muito especiais. É preciso que o
planeta passe à frente de uma estrela. A luz estelar, em sua viagem
rumo à Terra, passaria "de raspão" pelo planeta distante, atravessando sua atmosfera. Analisando a assinatura específica da
luz, os astrônomos podem descobrir coisas sobre o ar plutoniano.
Foi assim que a atmosfera de
Plutão foi descoberta, para começar, e foi desse modo que os astrônomos voltaram a observá-la, em
julho e agosto, quando o planeta
ocultou as estrelas P126 e P131.
Bruno Sicardy, do Observatório
de Paris, coordenou os esforços
franceses, que envolveram o recrutamento de diversos telescópios e estações móveis na América do Sul, espalhados por Chile,
Argentina e Brasil (o observatório
Pico dos Dias, do Laboratório Nacional de Astrofísica, tentou observar o fenômeno, sem sucesso).
A mesma coisa fizeram Marc
Buie, do Observatório Lowell, e
James Elliot, do MIT (Instituto de
Tecnologia de Massachusetts),
ambos dos EUA. Isso porque a
sombra de Plutão só seria visível
na América do Sul.
Juntando as peças
Eles já estão analisando os dados, que pretendem confrontar
durante um congresso de ciências
planetárias que acontece no Alabama, EUA, em outubro. "Somente quando juntarmos todas
as peças poderemos começar a
montar o quebra-cabeça", diz
Buie. Mas de uma coisa ele já está
convencido: alguma coisa está
mudando na atmosfera de Plutão.
"A atmosfera definitivamente
mudou. Mas ainda não saberíamos dizer exatamente como."
Sicardy é menos reticente sobre
os resultados. Ele afirma que a alta
atmosfera não sofreu mudança
significativa nos últimos 14 anos,
desde a última observação. Já a
baixa atmosfera (20 km de altitude ou menos) parece ter se resfriado com relação aos dados de 1988.
Isso em princípio confirmaria a
idéia de que o ar de Plutão está se
resfriando e tende a congelar, levando ao colapso da atmosfera.
Não se deve saltar tão depressa
para essa conclusão, afirma Sicardy. "Sabemos que a temperatura de Plutão varia de acordo
com a região do planeta, entre 40
K [-233C" e 60 K [-213C". Não
temos certeza de que nossa diferença nas medições esteja refletindo um resfriamento de Plutão
ao longo do tempo, ou simplesmente a temperatura de um lugar
diferente." E ele mesmo alerta que
é perigoso fazer qualquer aposta:
"Antes de concluirmos algo, seria
bom confirmar nossas conclusões
com as do grupo americano".
Numa coisa, tanto Sicardy
quanto Buie concordam: são resultados de primeira linha. Tanto
que o francês pretende submeter
seus resultados para publicação
na revista britânica "Nature" ou
na americana "Science". Buie já
até se decidiu pela última.
Sicardy acredita que a pressa
dos cientistas da Universidade
Johns Hopkins (EUA) que construíram a sonda New Horizons
para enviá-la logo a Plutão está
mais ligada ao fator humano do
que a um prazo a ser atingido.
"Eles querem construir algo que
sejam capazes de ver cumprindo
seu objetivo", diz.
Ser ou não ser?
Com os planos atuais, a New
Horizons deve partir em 2006,
chegando a Plutão dez anos depois. Mas por dois anos seguidos
a Nasa (agência espacial americana), responsável pelo financiamento, tem tentado cancelar a
missão, classificando-a como ineficiente. O projeto só segue caminhando porque o Congresso
americano tem orçado recursos
extras com esse propósito.
Buie considera a missão fundamental. "Quanto mais aprendemos sobre Plutão, mais empolgante fica o projeto", afirma. "E
há coisas que você não vai conseguir ver em Plutão, a não ser que
mande uma câmera para lá."
Para o astrônomo americano, o
problema da Nasa com a missão
está na natureza da instituição.
"Você sabe o que quer dizer a sigla "Nasa'?" -pergunta. As letras
correspondem a "National Aeronautics and Space Administration", ou "Administração Nacional Aeronáutica e Espacial".
"Eu não vejo a palavra "exploração" em nenhum lugar por aí. Você vê? É um órgão administrativo,
que precisa estar afinado com a
política do presidente", alfineta.
"Tem muita gente na Nasa que
sabe da importância da missão a
Plutão. Mas eles não podem fazer
nada", completa. "E acabou ficando com o Congresso a função de
ouvir a opinião pública e seguir
alimentando a missão."
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