São Paulo, sábado, 09 de dezembro de 2006

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Ebola matou até 5.500 gorilas na África

Aliada à caça, epidemia pode extinguir animais; plano de vacinação esbarra em dificuldades técnicas

DENISE GRADY
DO "NEW YORK TIMES"

O vírus ebola matou entre 3.500 e 5.500 gorilas em uma região da República do Congo entre 2002 e 2006, e sua propagação contínua, ao lado da caça, pode extingüir a espécie, afirma estudo na edição de ontem da revista "Science".
"Muitos animais estão morrendo", afirma o ecólogo Peter Walsh, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, em Leipzig (Alemanha), um dos autores do trabalho. "Há um declínio maciço."
Diversas vacinas contra o ebola desenvolvidas recentemente funcionam em animais de laboratório, incluindo macacos, e Walsh está ansioso para testá-las em gorilas selvagens. O imunizante pode ser injetado nos animais com dardos ou colocado em sua comida. Ao perseguir a disseminação do vírus e vacinar animais que estão em seu caminho, pode ser possível deter os surtos, afirma.
Outros pesquisadores afirmam que, apesar de a vacinação poder ser viável, ainda não se sabe se a imunização pode ser produzida em uma forma resistente ao calor ou que funcione via oral. Além disso, haveria um mar de burocracia para atravessar, envolvendo vários grupos conservacionistas, doadores e governos.
Stuart Nichol, biólogo molecular da divisão de patógenos especiais do CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA) afirma que será um "pesadelo" tentar implementar um programa de vacinação. "Não parece bom sentar-se e não fazer nada, mas na realidade será tremendamente difícil fazer algo", diz.
Os autores do trabalho estudam os gorilas-ocidentais (Gorilla gorilla) -espécie distinta dos gorilas-orientais (Gorilla beringei)- desde 1995 no Santuário Lossi, no noroeste da República do Congo, perto do Gabão. Em 2002, após surtos da doença em humanos causados pela linhagem Zaire do ebola, os pesquisadores começaram a achar gorilas mortos. Ao longo de alguns meses eles encontraram 33, testaram 12 para o ebola e encontraram o vírus em nove deles. De outubro de 2002 a janeiro de 2003, 130 dos 143 gorilas que eles estudavam simplesmente desapareceram. As perdas continuaram depois. Apenas quatro de 95 gorilas sob observação entre outubro de 2003 e janeiro de 2004 restaram após uma morte em massa. Muitos chimpanzés na região também morreram.
No início, alguns pesquisadores questionavam se era realmente o ebola que estava matando os gorilas, uma vez que poucas carcaças tinham sido submetidas a testes. Nichol diz que gostaria de ter visto mais testes, mas afirma que acredita nos resultados do grupo e reconhece que obter amostras é um trabalho difícil e perigoso.
A região é uma selva densa, gorilas machos atacam humanos que se aventuram muito perto e as carcaças infectadas são altamente contagiosas. Para coletar amostras, os cientistas tem de usar trajes herméticos especiais e filtros de ar.
Apesar de gorilas serem caçados por sua carne mesmo em reservas ecológicas, os autores afirmam que a atividade de caça na região não é suficiente para explicar tantas mortes entre 2002 e 2005 na região. E eles ainda afirmam que a estimativa de 3.500 a 5.500 é conservadora. Walsh diz que seu "chute calculado" é de que o ebola tenha matado um quarto dos gorilas do mundo desde 1992.

Caça ao hospedeiro
Gorilas e chimpanzés são os parentes mais próximos dos humanos e, assim como as pessoas, são fatalmente vulneráveis ao ebola, que mata por hemorragia e choque. A maneira com que o ebola se transmite, porém, ainda não é conhecida em detalhes.
Cientistas supõem que, os macacos devem contrair o vírus de outro animal que age como um hospedeiro natural e carrega o vírus sem ser morto. Morcegos frugívoros são suspeitos, mas nunca se encontrou um que fosse hospedeiro, diz Nichol. Não se sabe ainda se a infecção passada de um gorila a outro tem papel importante na epidemia.


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