São Paulo, quarta-feira, 10 de janeiro de 2007

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Nova nanopartícula imita o câncer para identificá-lo

Material que se "amplifica" sozinho se liga a células de tumor, tornando-as visíveis

Técnica também poderá ser usada para entregar quimioterapia com maior precisão; aplicação clínica ainda levaria uma década

EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL

Em vez de combater o inimigo, ligue-se a ele. Com esse princípio em mente, pesquisadores americanos conseguiram desenvolver um sistema nanotecnológico que imita o modo de agir de um tumor.
O sistema, assim como as células cancerosas, se "amplifica" sozinho. Só que, neste caso, para ajudar o paciente.
A nova técnica, apresentada ontem na forma de um artigo científico na revista "PNAS" (www.pnas.org), só foi testada por enquanto em camundongos. Mas, promete aumentar a precisão na detecção dos tumores em humanos.
"O avanço significativo foi que conseguimos fazer um sistema que se alimenta sozinho", disse à Folha o pesquisador Erkki Ruoslahti, do Instituto Burnham, da Califórnia.
Segundo o principal autor do estudo, a parte mais difícil foi conseguir o ajuste fino do experimento. "Tivemos de fazer muitas tentativas", recorda-se.
Antes de injetar as nanopartículas na corrente sangüínea dos camundongos, os pesquisadores desenvolveram um tipo de proteína capaz de reconhecer tecidos tumorais.
Depois da injeção, a expectativa do grupo de pesquisa se confirmou. Elas foram direto ao câncer e se ligaram a ele. A reação em cadeia, então, teve início. Novas nanopartículas foram se juntando às primeiras, fazendo com que o tumor ficasse evidente de forma artificial. Eis a imitação perfeita, que não danifica o organismo.

Sem especialistas
Há quem veja os resultados com ceticismo, no entanto. "Existe pouca relação entre os dados apresentados e as conclusões a que eles chegaram. Isso é normal quando uma pesquisa multidisciplinar não é conduzida com a especialização apropriada", afirma a bioquímica Renata Pasqualini, que pesquisa nanotecnologia e câncer na Universidade do Texas em Houston, Estados Unidos.
A cientista brasileira analisou o trabalho de Ruoslahti e colegas juntamente com os também brasileiros Wadih Arap e Glauco Souza, da mesma instituição. O trio tem usado vírus e nanopartículas de ouro para criar "cavalos-de-tróia" capazes de detectar tumores com precisão e destruí-los.
Apesar das ressalvas, o autor do trabalho está confiante que tem um bom método na mão. Mesmo assim, segundo ele, esses resultados ainda estão muito longe de qualquer tipo de aplicação médica.
"A realidade é que deveremos ter que esperar uma média de dez anos para que qualquer resultado saia do laboratório em direção ao campo clínico", afirmou o cientista americano.
O método apresentado agora, além de ajudar a identificar o tumor, também é seguro, explica o autor do estudo.
"Nós não registramos nenhum tipo de problema no camundongo depois que injetamos as nanopartículas. Isso não significa que nada poderá ocorrer no paciente. Principalmente, se houver outros tipos de patologia em curso além do câncer", explica.
A técnica das nanopartículas que se ligam aos tumores também pode levar a outro caminho dentro da nanomedicina: o de encolher a quimioterapia.
Como a técnica facilita a precisão no tratamento, ela poderá contribuir para que um tipo de medicamento qualquer seja levado diretamente ao local em que ele deverá realmente agir -no caso, o tecido doente.
Essa quimioterapia de altíssima precisão vem sendo perseguida por vários grupos de pesquisa -inclusive o de Pasqualini-, e é uma das maiores promessas da nanomedicina.


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