São Paulo, quinta-feira, 10 de fevereiro de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Próximo Texto | Índice

CIÊNCIA
Arqueóloga diz que fósseis no Piauí podem ter 15 mil anos

MARCELO LEITE
enviado especial a São Raimundo Nonato (PI)

Niède Guidon, 67, talvez a mais polêmica arqueóloga brasileira, se prepara para chocar mais uma vez seus pares com uma nova datação. Desta vez, ela diz ter encontrado os restos humanos mais antigos das Américas.
São três dentes humanos e um pedaço de crânio, escavados da gruta do Garrincho. Um dos dentes foi enviado aos Estados Unidos para ter sua idade estimada. Resultado, que segundo Niède chegou em janeiro: 15 mil anos.
Se for confirmada e aceita, baterá todos os outros restos humanos americanos conhecidos. Eles estão, em geral, abaixo dos 10 mil anos, como o famoso esqueleto de Luzia, encontrado no sítio de Lagoa Santa (Minas Gerais).
A aceitação pela comunidade científica só se dará depois da publicação das datas numa publicação científica de renome, o que ainda não aconteceu. A arqueóloga diz que só a descrição dos dentes e do fragmento de osso saiu publicada, pela Academia de Ciências da França, há dois anos.
Foi empregada na datação do dente uma variante técnica do método de carbono-14, a espectometria por aceleração de massa. Ela permite trabalhar com quantidades muito pequenas de matéria orgânica (ou seja, contendo carbono). Segundo a pesquisadora, esses dentes estavam muito fossilizados (mineralizados), portanto com muito pouca matéria orgânica. Somente a espectometria permitiria datá-los.
Guidon escava há três décadas os sítios da região da serra da Capivara, sudoeste do Piauí. O mais disputado deles, até agora, era o do Boqueirão da Pedra Furada.
Ali ela encontrou carvão, que diz ser de origem antropogênica (produzido pelo homem, em fogueiras), cujas datações em laboratório convenceram-na de que homens frequentavam os abrigos na rocha arenítica já entre 50 mil e 60 mil anos atrás.
Segundo as teorias tradicionais de ocupação das Américas, isso seria impossível. Por elas, hordas humanas penetraram no continente entre 10 mil e 20 mil anos atrás, por pontes de terra que se formaram na chamada Beríngia, hoje o estreito de Bering (que separa os extremos da Ásia e da América), com as glaciações.
Guidon defende que a espécie humana chegou em várias ondas à América, também por mar. Isso teria ocorrido 70 mil ou até 80 mil anos atrás. Essas hipóteses não são aceitas por críticos de trabalho de Niède Guidon. Especialmente resistentes são os arqueólogos norte-americanos. Mas pesquisadores brasileiros, como Walter Neves, da USP, também se recusam a aceitar tais idéias sobre migração, que Neves chama pejorativamente de "pirotecnias".


Próximo Texto: Gene pode melhorar atuação de atletas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.