São Paulo, quarta-feira, 10 de maio de 2000


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SAÚDE PÚBLICA
Metodologia pode melhorar qualidade do saneamento básico, que hoje só detecta a presença de bactérias
Técnica da USP identifica vírus na água

José Nascimento/Folha Imagem
Dolores Mehnert analisa amostras de córregos e esgotos de SP


GABRIELA SCHEINBERG
DA REPORTAGEM LOCAL

O Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveu um método para detectar a presença de vírus na água que pode fazer com que a tecnologia de saneamento básico do Brasil se equipare à de países como EUA, França, Austrália e Canadá.
Com a metodologia do ICB, que avalia simultaneamente a presença de rotavírus e adenovírus (principais agentes causadores de diarréia viral) e o vírus da hepatite A, a qualidade biológica da água poderá ser melhor avaliada.
Hoje, bactérias como coliformes fecais são investigadas por serem consideradas indicadores da qualidade da água. Mas os vírus, na verdade, são melhores indicadores, pois são mais resistentes a variações de temperatura e a outras substâncias presentes na água. A procura por vírus, no entanto, não é feita por falta de uma metodologia eficiente para aplicação rotineira.
Os vírus entéricos (presentes no intestino) são lançados no meio ambiente entre fezes de pessoas infectadas, contaminando rios, córregos e represas. Acabam chegando a alimentos, como hortaliças e frutos-do-mar, que tenham sido expostos à água infectada, seja pela irrigação, seja pelo lançamento de esgotos no oceano. Os vírus também podem ser transmitidos de pessoa para pessoa.
Embora as águas oriundas de mananciais sejam tratadas, a contaminação ao longo da rede de distribuição é possível. E, em regiões com saneamento básico precário, as pessoas entram facilmente em contato com água não-tratada ou contaminada.

Método sensível
A nova metodologia, proposta por Dolores Ursula Mehnert, professora doutora do departamento de Microbiologia do ICB, e sua equipe, utiliza recursos de biologia molecular. Ela permite que mesmo uma pequena quantidade do vírus seja identificada na água.
"Nunca teremos 100% de certeza", afirma Mehnert. "Se o vírus não for encontrado, ele pode estar em quantidades menores que a taxa de detecção, mas a metodologia aplicada é a mais sensível disponível no presente."
A análise começa com a coleta de 4 litros de água que é filtrada repetidamente, para obter uma amostra com uma concentração de vírus até 8.000 vezes maior. A intenção é acumular as partículas do vírus e remover substâncias que podem "esconder" a sua presença. A amostra final tem 0,5 ml.
A próxima etapa é detectar o material genético dos vírus, aumentando o número de cópias por meio de uma técnica chamada PCR (reação de polimerase em cadeia, na sigla em inglês). O PCR é uma espécie de amplificador de DNA capaz de produzir milhões de cópias idênticas de um trecho.
A vantagem desse método é que, além de quantificar o vírus, ele também identifica o subtipo de cada um. Dispondo de uma quantidade manipulável de DNA, o pesquisador pode analisar a sequência de letras químicas que o compõe e, assim, determinar a identidade do vírus.
Mehnert criou uma metodologia parecida há dez anos. Com o avanço da biologia molecular, foi possível aprimorar a técnica. "Criamos uma metodologia simples e eficiente", diz. O procedimento custará cerca de R$ 7 a R$ 10 por amostra.
A pesquisadora afirma que a tecnologia seria importante para a Sabesp, "para o controle de qualidade de abastecimento de água", diz. O próximo passo de sua pesquisa, que é financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), é analisar água de abastecimento.
"Com essa metodologia, será possível conduzir pesquisas epidemiológicas para detectar quais os vírus circulantes nas águas que podem representar risco à saúde da população. No Brasil, a pesquisa de vírus no meio ambiente ainda é muito restrita."


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