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São Paulo, terça-feira, 11 de novembro de 2003

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MEDICINA

Sala com nível de segurança 3+ é a primeira do Brasil para lidar com microrganismos perigosos e pouco conhecidos

Laboratório da USP vai abrigar supervírus

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

"Daqui só sai vivo o pesquisador", brinca o biomédico Edison Luiz Durigon, 47. A verdadeira prisão de segurança máxima biológica à qual o pesquisador do ICB (Instituto de Ciências Biomédicas da USP) se refere deve ser inaugurada, hoje, às 14h. É o primeiro laboratório de nível de biossegurança 3+ do Brasil, capaz de lidar com vírus desconhecidos e potencialmente letais.
O Laboratório Klaus Eberhard Stewien ganhou o nome de um virologista alemão naturalizado brasileiro que ajudou a conter a paralisia infantil no país. Foi construído com investimento de R$ 1 milhão da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). Até o final do ano que vem, outras instalações tão seguras quanto ele devem ser concluídas na USP de Ribeirão Preto, no Instituto Adolfo Lutz da capital e na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto.

Doenças emergentes
"Parece que o final do século passado e o começo deste têm sido das doenças emergentes", diz Durigon. "E a preocupação com o bioterrorismo também é algo mundial. Por isso é importante normatizar a pesquisa nessa área: ou você tem os requisitos necessários para manipular esses agentes transmissores, ou desiste de estudá-los", afirma o pesquisador, que já teve de parar pesquisas com vírus influenza (aparentados ao da gripe) isolados de aves migratórias por não contar com as instalações necessárias.
Ao lado de seus colegas Paolo Zanotto, também do ICB, e Eduardo Massad, da Faculdade de Medicina da USP, Durigon coordena a Rede de Diversidade Genética de Vírus da Fapesp, cujo principal objetivo é exatamente mapear tipos de vírus pouco conhecidos -os chamados emergentes- e avaliar o risco que oferecem para a saúde humana. Para lidar com esses inimigos ainda misteriosos, o único jeito é implementar laboratórios NB3+ (leia o quadro acima).
As condições da sala de 50 m2 são monitoradas constantemente por computador, que verifica se a temperatura é a desejada (por volta de 20C) e se a pressão atmosférica do laboratório é menor que a de fora, para evitar que o ar do recinto leve os patógenos para o exterior. O ar é filtrado duplamente: quando entra e quando sai.
Para entrar no laboratório, os visitantes precisarão se despir e envergar um macacão impermeável cujo tecido, estruturado como um filtro, impede a passagem de quaisquer bactérias. Uma máscara (que também tem seu filtro de ar), luvas e óculos completam o figurino. "Uma das poucas diferenças entre o nosso laboratório e um de nível 4 é que, no nível superior, as pessoas usam uma tubulação para respirar só o ar de fora", explica Durigon.
A sala trata seu próprio esgoto e sua própria água, aquecendo-a a 140C e depois resfriando-a, tudo para eliminar intrusos virais indesejáveis. Para sair, é preciso tomar uma ducha com 20 litros de água com cloro desinfetante, seguida de mais 30 litros de água pura.
Além do vírus da Sars (pneumonia atípica), a equipe vai investigar arbovírus (o grupo do vírus da dengue), hantavírus (transmitidos pelas fezes de roedores silvestres e causadores de pneumonias hemorrágicas) e o vírus do oeste do Nilo, que não chegou ao Brasil, mas já matou 200 pessoas nos EUA neste ano.
Para Paolo Zanotto, o problema dos vírus emergentes, em geral surgindo em áreas desmatadas, tem de ser levado a sério: "Há 2 milhões de febres desconhecidas por ano na Amazônia", ressalta.


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