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COPENHAGUE 2009
Gado gera 50% da emissão do país
Pecuária brasileira emitiu entre 812 milhões e 1,1 bilhão de toneladas de gases-estufa desde 2003
Estudo calculou impacto do boi em desmate, queimadas e gases de digestão; Brasil não tem plano específico para lidar com problema
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
LUCIANA COELHO
ENVIADA ESPECIAL A COPENHAGUE
Pelo menos metade das
emissões brasileiras de gases
do efeito estufa é causada pela
pecuária bovina, indica um estudo interdisciplinar divulgado
ontem. A maior parte do problema se deve ao desmatamento para abrir pastagens na
Amazônia e no Cerrado, afirma
o trabalho, mas a fermentação
entérica do gado (metano exalado pelos bois) e as queimadas
nas áreas de pastagem dão uma
dimensão maior ao problema.
O estudo, divulgado ontem
em São José dos Campos no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais), será objeto
também de apresentação na
conferência do clima de Copenhague. O plano de corte de
emissões que a delegação do
país leva ao encontro, porém,
não tem uma abordagem específica para cuidar dos bois.
O problema, claro, já era conhecido, mas é a primeira vez
que uma pesquisa compila as
informações para medir o impacto particular da pecuária
nas emissões. "Se você desmata
o cerrado e a mata amazônica
para criar bois, aquele desmatamento está associado à pecuária", diz Carlos Nobre, do
Inpe, um dos líderes do estudo.
Segundo o trabalho, a pecuária é responsável em média por
75% do desmate na Amazônia e
56% no Cerrado. A estimativa
se refere ao período de 2003 a
2008. No último ano, a emissão
total de gases-estufa pela pecuária nacional foi equivalente
a 813 milhões de toneladas de
CO2. Em 2003, sob desmatamento maior, era de 1,1 bilhão.
Segundo um dos autores do
estudo, Roberto Smeraldi, da
ONG Amigos da Terra, os valores podem parecer altos, mas
são conservadores. "Aspectos
da emissão de gases-estufa do
solo por conta de degradação
de pastagens, de transporte do
gado e do uso de energia pelos
frigoríficos não entraram nesta
conta", afirma. "Vamos avaliar
isso depois."
Sem planos
Indagado sobre o resultado
do estudo, o embaixador extraordinário do Brasil para clima, Sérgio Serra, afirmou que
ele não é tratado dentro da proposta brasileira de redução de
emissões. O plano apoia-se majoritariamente na coibição do
desmatamento -sem discriminar quem está desmatando- e
prevê ações no setor agrícola,
mas em nenhum dos dois pontos a pecuária é abordada como
uma questão específica.
"No plano nacional da mudança do clima do qual emanou
essa política nacional que foi
aprovada agora no Congresso,
ela [política pecuária] deve até
entrar em algum detalhamento", disse Serra em Copenhague. "Mas não está nesse pacote
que estamos oferecendo aqui.
Não há um acordo específico."
Para Gilberto Câmara, diretor do Inpe, mitigar as emissões
resultantes da criação de gado
não cabe à conferência, mas ao
país. "Acho que em nenhum
outro lugar o desmatamento é
associado com a pecuária tanto
quanto no Brasil", disse.
A revelação do peso da pecuária nas emissões brasileiras
é uma má notícia do ponto de
vista comercial, uma vez que o
gado brasileiro já enfrenta restrições não tarifárias para entrar em mercados externos.
Países europeus que assumirão
meta de corte de emissões podem querem taxar a entrada de
carne brasileira, já que vão arcar com o ônus da mitigação.
A depender do resultado de
Copenhague, porém, o Brasil
sairá em vantagem. Com mecanismos que atribuam valor ao
carbono que um pecuarista deixa de emitir (ao evitar desmatar ou ao mudar a dieta do gado), um país rico poderia "comprar" essa emissão. Ainda não
está claro como fazer isso, mas
o potencial é grande. "O custo
das emissões de carbono por
unidade de produto [a carne]
supera o próprio custo do produto no atacado", diz Smeraldi.
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