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54ª REUNIÃO ANUAL DA SBPC
Grupos formados no Rio e em São Paulo dão início a projetos de proteômica, o estudo dos tijolos fundamentais dos organismos
Brasileiros apostam na era pós-genoma
RICARDO BONALUME NETO
ENVIADO ESPECIAL A GOIÂNIA
Duas redes de pesquisa, uma em
São Paulo e outra no Rio de Janeiro, vão iniciar o estudo em larga
escala de proteínas -os "tijolos"
básicos codificados pelos genes
que são responsáveis pela imensa
maioria das funções dos organismos- em igualdade de condições com os principais centros de
pesquisa do mundo.
Até o final do ano os primeiros
resultados importantes já estarão
sendo divulgados, segundo declarou na 54ª Reunião Anual da
SBPC (Sociedade Brasileira para o
Progresso da Ciência), encerrada
ontem em Goiânia, o pesquisador
Elias Walter Alves, um dos coordenadores da rede fluminense. "É
um assunto em que o Brasil
acompanha passo a passo o resto
do mundo. O Brasil tem enorme
tradição em pesquisa de proteínas, mais do que tinha com genoma", diz Alves, diretor do Centro
de Biociências e Biotecnologia da
Uenf (Universidade Estadual do
Norte Fluminense), em Campos
(a 240 km do Rio).
Se o genoma é o conjunto do
material genético de um organismo vivo, ou seja, a "receita" para
sua fabricação, seu "proteoma" é
o resultado disso -o conjunto de
suas proteínas, as substâncias que
constituem tanto as "peças" que
formam o ser como as que o mantêm em funcionamento.
Em outras palavras, analisar o
proteoma é dar um passo além do
genoma -um mais diretamente
prático. Tradicionalmente os
cientistas estudam proteínas isoladamente. A proteômica envolve
o estudo das propriedades dessas
substâncias em larga escala.
As duas redes estão sendo financiadas com verbas estaduais,
das respectivas fundações de amparo à pesquisa, Fapesp e Faperj.
A rede fluminense foi lançada
primeiro, no fim do ano passado,
e já está em operação. São cinco
laboratórios em três instituições
-além da Uenf, dois na UFRJ
(Universidade Federal do Rio de
Janeiro) e um na Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz). O coordenador é Paulo Bisch, da UFRJ.
Venenos na mira
Os principais objetivos da Rede
de Proteômica do Rio de Janeiro
são as proteínas das células humanas envolvidas na luta contra o
vírus causador da dengue (além
das do próprio micróbio), as proteínas da bactéria causadora do
cólera, as de toxinas (venenos)
animais e as da bactéria responsável pela fixação do nitrogênio na
raiz da cana-de-açúcar, a Gluconacetobacter diazotrophicus.
A equipe de Alves optou por estudar as proteínas do veneno da
cobra surucucu-pico-de-jaca, talvez a mais temida das cobras brasileiras, capaz de injetar até cinco
mililitros de veneno em uma picada, uma dose fortíssima.
"É o modelo ideal para treinar
uma equipe", diz Alves. É mais fácil trabalhar com um veneno, cujas proteínas são solúveis, do que
com uma célula.
Venenos têm propriedades que
podem ser úteis para desenvolver
medicamentos. Um exemplo
clássico de droga criada a partir
de estudos com toxinas animais é
o captopril, para hipertensão, derivado do veneno da jararaca.
A equipe de Alves já tem um resultado que sairá logo na revista
"Parasitology Research". Uma
fração de veneno de cobra matou
o parasita causador da doença de
Chagas, o Trypanosoma cruzi.
O estudo de toxinas animais é
uma área em que a comunidade
científica brasileira tem impacto
mundial -16% dos artigos publicados são nacionais, diz Alves.
A pesquisa de proteomas envolve equipamentos sofisticados e
caros, em geral importados. Um
dos mais importantes é o espectrômetro de massa, uma espécie
de "balança" que "pesa" os elementos constitutivos da proteína.
Fazer proteômica, diz ele, é como "quebrar um relógio com um
martelo e depois tentar reconstituir as partes" -os fragmentos
que constituem as proteínas.
A Faperj destinou verba de R$ 2
milhões para o projeto.
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