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SAÚDE
Medicamento deve chegar ao mercado em um ano
Nova droga combate pressão alta e paradas cardíacas em negros
SALVADOR NOGUEIRA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Embora a ocorrência de várias
doenças se distribua de forma irregular entre as etnias, a indústria
farmacêutica até hoje se mostrou
indiferente a esse detalhe. Agora,
o status quo parece estar mudando, e o pontapé inicial deve ser dado por um novo medicamento,
voltado para o combate de problemas cardíacos em negros.
A nova droga -chamada BiDil- está a um passo de obter autorização da FDA (agência que regula medicamentos nos EUA) para ser comercializada. "Os últimos testes começarão no mês que
vem e devem durar um ano. Podemos já ter a autorização no fim
de 2002", disse à Folha Jay Cohn,
o cardiologista da Universidade
de Minnesota que criou a droga.
Negros estão mais sujeitos que
caucasianos a hipertensão e paradas cardíacas principalmente por
deficiência de óxido nítrico, segundo Cohn. Essa substância age
no organismo como um vasodilatador, baixando a pressão.
O óxido também é necessário
ao funcionamento de outros medicamentos comuns usados contra pressão alta -os inibidores de
ECA (enzima de conversão da angiotensina). Essas enzimas são
responsáveis pela constrição
(compressão) dos vasos sanguíneos, o que ocasiona hipertensão.
Os inibidores suprimem a ação
das enzimas, mantendo a pressão
sob controle -mas só quando há
óxido nítrico disponível.
O BiDil é classificado justamente como um doador de óxido nítrico. Ou seja, ele se propõe a dilatar os vasos, fornecendo o óxido
nítrico necessário. Os testes de
Cohn, que trabalha na droga desde 1980, mostram que os negros
reagem melhor ao BiDil, enquanto brancos apresentam melhores
resultados ao usar os inibidores.
"A droga prolongou a vida entre os negros, mas não ofereceu
benefício significativo entre os
caucasianos", conta o cardiologista. Os testes foram feitos com
grupos de 640 e 800 pessoas, dentre os quais 25% eram negros.
Mesmo assim, o número de pacientes envolvidos é pequeno para ser definitivo. "É sem dúvida
uma pista a ser seguida, mas não é
conclusivo", afirma Antonio Carlos Carvalho, professor de cardiologia da Unifesp. Ele aponta que
peculiaridades dos pacientes não
relacionadas à etnia poderiam
causar desvios nos resultados.
Aliás, a execução dos grandes
testes para a posterior liberação
da droga no mercado foi, por
muito tempo, a maior dificuldade
da pesquisa. "Os primeiros testes
foram financiados pelo governo
federal, mas não havia recursos
para grandes testes", diz Cohn.
No ano passado o problema foi
resolvido quando ele licenciou o
uso de sua patente para a Nitromed, a empresa que está bancando a bateria final de testes.
Cohn espera que seus testes incentivem a indústria farmacêutica a investir em diferenças étnicas
na hora de testar seus medicamentos. "Todos os estudos com
drogas deveriam levar em conta
os resultados nos diferentes grupos raciais. Isso não costumava
ser feito antes, mas há um grande
mercado se abrindo para drogas
mais específicas."
Uma das qualidades do novo
medicamento é que ele reúne
duas drogas conhecidas em uma,
o isosorbido dinitrato e a hidralazina. "Quanto menos comprimidos o paciente toma, mais fácil fica de administrar o tratamento",
afirma Eulogio Emilio Martinez
Filho, cardiologista do Incor (Instituto do Coração), em São Paulo.
Essas drogas já eram usadas para o tratamento de hipertensão e
insuficiência cardíaca, mas exigiam que o paciente ingerisse
mais comprimidos. O menor número de drogas faz com que a
aderência do paciente ao tratamento seja maior, ou seja, causa
menos desistências.
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