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São Paulo, quinta-feira, 14 de agosto de 2003

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CLIMA

Região norte do oceano teve a salinidade aumentada pela falta de chuvas, diminuindo fixação de gás do efeito estufa

Pacífico perde capacidade de absorver CO2

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Um dos mais importantes mecanismos do planeta para absorver CO2, o principal gás responsável pelo aquecimento global, pode estar com defeito. Oceanógrafos americanos verificaram que o Pacífico está diminuindo sua capacidade de retirar o gás da atmosfera -mais uma má notícia para o já combalido clima da Terra.
"Nosso estudo não diz nada sobre aquecimento -de fato, não houve mudança significativa na temperatura da superfície do oceano nos 13 anos de dados que nós analisamos", afirma o oceanógrafo John Dore, 37, da Universidade do Havaí.
Entretanto, mesmo sem reviravoltas perceptíveis na temperatura, Dore e seus colegas Roger Lukas, Daniel Sadler e David Karl perceberam que uma seca persistente no Pacífico Norte aumentou a concentração de sal do oceano e, consequentemente, sua capacidade de retirar o indesejável dióxido de carbono da atmosfera.
"O oceano funciona como um sorvedouro de carbono sempre que a pressão do CO2 nas águas superficiais é menor que a pressão do CO2 no ar acima delas", explica Dore. Na prática, isso significa que o gás tende a passar dos lugares onde sua concentração é maior para as áreas onde ele existe em menor concentração.
Quando uma área do oceano está borbulhando de fitoplâncton (microrganismos marinhos que fazem o papel das plantas, transformando gás carbônico e luz em biomassa), por exemplo, a tendência é que o CO2 na água diminua e o que existe na atmosfera passe para o mar.
Por outro lado, quando as águas mais frias e cheias de material orgânico do fundo do oceano são aquecidas e chegam à superfície, cresce a concentração do gás, e ele volta para a atmosfera. "A região central do Pacífico Norte, onde nós conduzimos o nosso estudo, é um sumidouro de carbono, embora não muito forte. Mesmo assim, ela é importante por causa de sua grande área", afirma Dore, cujo estudo está na revista "Nature" (www.nature.com)

Situação salgada
Há, contudo, outro fator envolvido: o grau de salinidade do mar. A seca que os pesquisadores havaianos observaram em 13 anos de dados da estação meteorológica Aloha, cujo pico se deu entre 1996 e 2000, causou uma evaporação exagerada da água oceânica. Ou seja: comparativamente, havia menos água e mais sal ou outras substâncias dissolvidas nela -incluindo o CO2, que passou a escapar para a atmosfera em vez de afundar no oceano.
O difícil é saber quão abrangente é o fenômeno. Dore diz que a seca observada pelo grupo havaiano cobriu boa parte das latitudes médias do Pacífico Norte e pode estar ligada a uma seca ainda maior que atingiu a América do Norte e a Europa, mas a conexão entre os dois eventos ainda precisa ser confirmada.
Seja como for, o oceanógrafo afirma que é preciso começar a prestar atenção no fenômeno: "Até onde nós sabemos, ninguém tinha reconhecido que esse mecanismo poderia ser importante no ciclo do carbono. A química por trás dele está bem estabelecida, mas, sem de dados de longo prazo, nenhuma evidência dos efeitos das mudanças de salinidade teria aparecido".
Se o fenômeno for persistente (e Dore diz que apenas vários anos de muita chuva poderiam revertê-lo), regiões marinhas que hoje engolem dióxido de carbono podem se transformar em fontes dele. Mais CO2 na atmosfera significa mais retenção de energia solar na Terra -e, portanto, um aquecimento global mais acentuado.
Dore, contudo, pede cautela."É só observando pacientemente áreas específicas do oceano por longos períodos que poderemos entender essa variabilidade."


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