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ASTRONÁUTICA
Sucesso da nave Shenzhou no primeiro vôo tripulado porá o país na elite espacial, ao lado de Rússia e EUA
Chineses tentam hoje conquista do espaço
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
O palco já está pronto para o
primeiro vôo tripulado do programa espacial chinês, a ser conduzido a partir do Centro de Lançamento de Jiuquan, localizado
na porção noroeste do país.
A nave Shenzhou-5 deve decolar na noite de hoje (se tudo correr
bem, por volta das 22h, horário de
Brasília) no topo de um foguete
Longa Marcha-2F, com a primeira tripulação lançada ao espaço
por um veículo que não pertence
nem a russos, nem a americanos.
Se o lançamento for bem-sucedido, a China se tornará o terceiro
país capacitado a levar seres humanos à órbita terrestre, repetindo feito já realizado pela União
Soviética (hoje Rússia), em 1961, e
pelos Estados Unidos, em 1962.
Segundo o planejamento das
equipes técnicas na China, no final da noite de ontem os últimos
sistemas elétricos da plataforma e
do lançador estariam sendo testados, procedimento que antecede
o abastecimento do foguete para a
realização da decolagem.
A idéia é conduzir o lançamento
na manhã de quarta-feira em Jiuquan (noite de hoje em Brasília),
mas, se as condições meteorológicas locais não favorecerem a missão, podem ocorrer adiamentos.
Polêmica antes do vôo
Os detalhes do plano de vôo da
missão foram definidos no último
sábado, em meio a um conflito
entre as agendas técnica e política
do programa espacial chinês.
Alguns dos gerentes defendiam
uma missão com duração de vários dias e dois tripulantes a bordo, mais arrojada que as conduzidas pelo russo Iuri Gagarin e pelo
americano John Glenn, os pioneiros de vôo orbital. Gagarin, a bordo da Vostok-1, fez missão de
apenas uma órbita, em uma hora
e 48 minutos -até hoje o vôo orbital mais curto da história. John
Glenn, na Mercury Friendship-7,
deu três voltas completas, em
quatro horas e 55 minutos.
Os engenheiros se apoiavam na
capacidade total na Shenzhou,
que é muito superior às antigas
Mercury e Vostok. Trata-se de um
veículo até mais versátil do que a
Soyuz TMA (última versão da venerável nave russa, usada desde
1967), com capacidade para três
tripulantes e 20 dias de vôo autônomo.
Por outro lado, preocupações
com a segurança e a visibilidade
gerada por um vôo de curta duração, que poderia ser coberto na
íntegra pela televisão chinesa,
apontavam na direção de uma
missão curta, com apenas um astronauta a bordo da nave.
O plano final ainda não foi
anunciado, mas, segundo a agência de notícias chinesa Xinhua, o
vôo será basicamente o mesmo
realizado pelo primeiro protótipo
da Shenzhou, lançado em 1999: 14
órbitas circulares, durante 21 horas, a uma altitude de 350 km.
Ninguém ainda é capaz de afirmar com certeza o número de tripulantes a bordo. Embora a nave
esteja configurada para dois (um
piloto e um engenheiro de vôo), a
tendência é que se opte por um
viajante solitário -até para reforçar a imagem de um pioneiro e
herói chinês, alguém que se recubra da mesma glória compartilhada por Gagarin e Glenn.
Em tese, qualquer um dos 14 astronautas chineses poderia estar a
bordo da nave. Desses, três foram
pré-escolhidos e enviados ao centro de lançamento em Jiuquan. Os
candidatos mais prováveis a um
dos assentos na Shenzhou-5 são
Li Qinglong e Wu Jie, que foram
originalmente preparados no
Centro Gagarin de Treinamento
de Cosmonautas, nas cercanias de
Moscou, e formaram com sua experiência as bases para o programa de treinamento chinês.
Clube do vôo tripulado
A Rússia teve participação direta no desenvolvimento da nave
chinesa. Embora o projeto da
Shenzhou tenha sido totalmente
concebido na China, ele teve forte
envolvimento de especialistas
russos e contou com a ajuda da
empresa RSC Energia, que vendeu uma cápsula de reentrada da
Soyuz aos chineses, para estudos.
Quanto aos americanos, parecem estar recebendo a China de
braços abertos. "Não posso falar
pela Nasa, mas, como um cientista aqui na Nasa, estou encantado
que nossos colegas na China estejam tão interessados em exploração espacial e rumando para o
mundo das nações espaciais. Ajudará a mover a humanidade para
fora de nosso planeta e, com sorte,
para Marte", disse à Folha James
Garvin, cientista-chefe do programa de exploração marciana da
agência espacial americana.
"Eu acho que é um potencial
evento histórico, que pode se sobrepor à minha missão, e já estou
pensando nele", disse em entrevista coletiva o astronauta Michael Foale, americano. Com o
russo Alexander Kaleri e o espanhol Pedro Duque, ele deve viajar
rumo à ISS (Estação Espacial Internacional) no próximo sábado,
numa nave Soyuz, para realizar a
troca de tripulação do complexo.
"Devemos ver isso positivamente,
e não como uma ameaça."
Manifestação similar partiu de
Sean O'Keefe, administrador da
Nasa. Questionado a respeito, disse aceitar a palavra da China de
que suas intenções no espaço são
de ordem pacífica. O país pode até
mesmo vir a se tornar mais um
membro do grupo que coopera
na construção da ISS. Foi o que
defendeu o ex-astronauta Edwin
"Buzz" Aldrin (segundo homem
a pisar na Lua), em entrevista ao
site especializado Space.com.
Os chineses também estão vendo com bons olhos futuras oportunidades de cooperação entre os
times grandes da exploração espacial. Em entrevista à agência
noticiosa Xinhua, Zhang Qingwei, um dos gerentes do programa tripulado chinês, identificou
cinco áreas para cooperação internacional: construção de estações, realização de vôos espaciais,
uma base lunar, um pouso tripulado em Marte e turismo espacial.
Para ele, a humanidade deverá
fazer seu retorno à Lua em duas
décadas. Por enquanto, os únicos
planos lunares da China consistem numa sonda não-tripulada, a
Chang'e, que deve ser lançada rumo ao satélite natural em 2006.
"Nos 20 anos que virão, seres
humanos viajarão pelo espaço, e o
turismo espacial vai definitivamente se tornar uma indústria",
afirmou. "Com o desenvolvimento da tecnologia de vôos tripulados, a humanidade irá constantemente ampliar sua capacidade de
usar recursos espaciais e saltar
adiante na exploração do espaço."
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