São Paulo, quinta-feira, 14 de outubro de 2004

Próximo Texto | Índice

PALEONTOLOGIA

Esqueleto de carnívoro descoberto na China tem postura preservada e reforça ligação entre os dois grupos

Dinos dormiam como aves, revela fóssil

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA

Um filhote de dinossauro que morreu dormindo há 130 milhões de anos na China é a mais nova evidência de que os pássaros de hoje são os herdeiros daqueles répteis. Seu esqueleto preserva um flagrante inédito da posição do animal durante sua última soneca. E mostra que os dinos dormiam exatamente como as aves.
A postura é conhecida de qualquer pessoa que já tenha visto um pato cochilando à beira de um lago: pescoço curvado para trás e cabeça escondida sob uma das asas. Foi assim que a morte apanhou o pequeno dinossauro, que recebeu dos pesquisadores que o descobriram o apropriado nome de Mei long -dragão em sono profundo, em chinês.
O Mei long é um exemplo único daquilo que os paleontólogos chamam de comportamento fossilizado. Sendo apenas impressões numa rocha de um organismo que morreu há muito tempo, os fósseis geralmente não dizem muita coisa sobre o cotidiano desse organismo. E tais detalhes podem ser essenciais para definir relações de parentesco.
No caso do novo dinossauro chinês, de apenas 53 cm de comprimento, o comportamento foi congelado no tempo provavelmente devido a uma tragédia: uma erupção vulcânica que arrasou uma parte da atual Província de Liaoning, nordeste chinês, e soterrou sua fauna e flora em cinzas quentes, como aconteceu na cidade italiana de Pompéia.
"Nós não sabemos exatamente como ele morreu. Pode ter sido asfixiado por gases do vulcão. Só sabemos que ele foi soterrado rapidamente", disse à Folha o paleontólogo Xing Xu, 35, da Academia Chinesa de Ciências, que descreve o Mei long na edição de hoje do periódico científico britânico "Nature" (www.nature.com).
Os fósseis espetacularmente preservados de Liaoning já renderam a Xu e seus colegas descobertas que estão ajudando a resolver os dois grandes debates da paleontologia: a relação evolutiva entre dinossauros e aves e o "sangue quente" versus "sangue frio".
O grupo de Xu encontrou várias espécies de terópodes (dinossauros bípedes predadores) com penas. Como a maior parte deles não voava, a aposta é que as penas tenham surgido no ancestral comum entre as aves e esses dinos carnívoros para alguma outra função, como a de "radiador"; elas ajudariam a manter constante a temperatura corporal.
Para alguns paleontólogos, isso é um sinal de que pelo menos os terópodes tinham um metabolismo semelhante ao das aves e regulavam sozinhos a temperatura do corpo -tinham "sangue quente", diferentemente dos outros répteis, de "sangue frio".

"Galinhassaurus rex"
Na semana passada, o próprio Xu publicou um desses achados fenomenais na mesma "Nature": o Dilong paradoxus, ancestral do Tyrannosaurus rex, que tinha o corpo coberto de penas.
O próprio Mei long, além da postura reveladora, tem características físicas que o aproximam das aves, como o crânio. "Se não fosse a presença de dentes, seria um crânio aviano", diz Reinaldo José Bertini, paleontólogo da Unesp de Rio Claro.
Segundo Xu, As evidências de que o Mei long estivesse dormindo na hora da morte vêm tanto da composição das rochas em que ele foi achado como da simetria dos ossos. "Se você compara com qualquer outro esqueleto de dinossauro, a postura é diferente", afirmou. "O fóssil mostra que ele teve uma morte tranqüila."


Próximo Texto: Grupo vivia seu apogeu quando sofreu extinção
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.