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NEUROCIÊNCIA
Área do cérebro relacionada a linguagem sofre mais modificação quanto mais cedo se aprende outra língua
Bilíngues têm massa cinzenta mais densa
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Aprender uma segunda língua
modifica de fato a anatomia do
cérebro. E, quanto mais cedo se
aprende, maior a modificação, segundo uma pesquisa relatada na
edição de hoje da revista científica
britânica "Nature".
O achado é uma comprovação
neurológica de algo que qualquer
imigrante que tenha filhos sabe
muito bem: crianças tendem a
aprender idiomas com mais facilidade do que adultos.
Pesquisadores de Reino Unido e
Itália fizeram imagens por ressonância magnética funcional do
cérebro e constataram que os bilíngues têm uma densidade maior
da chamada "massa cinzenta" na
região cerebral conhecida como
córtex parietal inferior esquerdo.
"O grau de reorganização estrutural nessa região é modulado pela proficiência obtida e pela idade
de aquisição", afirmam Andrea
Mechelli e colegas do Departamento Wellcome de Imageamento de Neurociência, de Londres, e
da Fundação Santa Lúcia, de Roma, que assinam o estudo.
Densidade
O objetivo da pesquisa era testar
a densidade das massas cinzenta e
branca do cérebro. A primeira é
composta principalmente por
corpos celulares ("cabeças") de
neurônios, e a segunda, pelas
"caudas" de células nervosas. É
chamada de branca porque contém mielina, um lipídio que ajuda
a conduzir impulsos nervosos.
Os primeiros testes foram feitos
com pessoas que tinham o inglês
como língua nativa. Foram recrutados 25 monoglotas com pouca
exposição a línguas estrangeiras;
25 bilíngues "precoces", isto é,
que aprenderam uma segunda
língua européia antes de cinco
anos de idade e a continuaram
praticando; e 33 bilíngues "tardios", que só aprenderam outra
língua entre os 10 e os 15 anos. Todos os voluntários tinham idades
e grau de educação semelhantes.
Não houve diferença em relação
à massa branca, mas a densidade
da cinzenta foi maior entre os bilíngues, e maior ainda entre os bilíngues "precoces".
O segundo teste envolveu 22 voluntários que tinham o italiano
como língua nativa e aprenderam
inglês entre 2 e 34 anos de idade.
Suas habilidades em leitura, escrita, compreensão e conversa foram testadas.
Os pesquisadores descobriram
que o grau de proficiência correspondia exatamente ao grau de
densidade da matéria cinzenta no
córtex parietal inferior esquerdo.
E que, quanto mais cedo se aprendia a segunda língua, maior o efeito sobre aquela área do cérebro.
Já se sabia por estudos anteriores que essa região do cérebro é
ativada durante a realização de tarefas ligadas à fluência verbal.
"Esses efeitos podem resultar de
uma predisposição genética para
maior densidade, ou de uma reorganização estrutural induzida pela experiência", afirmam os autores da pesquisa.
Ainda não se sabe o que causa a
densidade maior. Pode ser o aumento do tamanho das células
nervosas -os neurônios-, da
sua quantidade ou das conexões
entre elas.
"Esses resultados são consistentes com as evidências crescentes
de que o cérebro humano se modifica estruturalmente em resposta a demandas do ambiente", concluem os pesquisadores.
O próximo passo da equipe vai
ser estudar o cérebro de pessoas
com dificuldade para aprender
línguas e também de poliglotas,
para checar se o aumento da densidade é proporcional ao número
de línguas faladas.
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