São Paulo, sábado, 15 de abril de 2000


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MEDICINA
Estudo indica que vírus altera as proteínas da superfície para se esconder do sistema de defesa do corpo
Mutação agrava virulência de hepatite C

da Reportagem Local

A "esperteza" do vírus da hepatite C (HCV), que altera sua aparência após uma pessoa ser infectada por ele, pode explicar por que alguns casos resultam em quadros crônicos, levando a problemas mais graves como cirrose hepática e câncer de fígado.
Cientistas do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas (Niaid, na sigla em inglês), dos Estados Unidos, selecionaram 12 pacientes que foram infectados pelo vírus, mas tiveram destinos diferentes. Enquanto alguns manifestaram uma infecção aguda, outros tiveram hepatite fulminante ou crônica.
A intenção da pesquisa era descobrir modificações no HCV que indicassem por que as pessoas tinham resultados diferentes para uma infecção causada pelo mesmo agente.
"Essa pesquisa pode explicar como o vírus consegue se manter no corpo, além de dar informações que permitirão aos cientistas preverem o desenvolvimento crônico da infecção", disse Anthony Fauci, diretor do Niaid.
Segundo o estudo, publicado ontem na revista "Science", em 15% dos casos os portadores do HCV são curados. A infecção se torna crônica em 85% dos casos.
Etapas iniciais
A tese da pesquisadora Patrizia Farci, coordenadora do estudo, era a de que o HCV se modificava durante a infecção. "Alguma coisa ocorre nas etapas iniciais da infecção que pode antecipar o destino dos pacientes", afirmou Farci, que também trabalha na Universidade de Cagliari, na Itália.
Mudanças foram observadas nas proteínas da superfície do vírus. Uma vez que a superfície se modifica, o sistema de defesa do corpo não consegue mais identificar o vírus. Isso permite que o HCV "disfarçado" se esconda do sistema de defesa e que a infecção se torne crônica e mais grave.
Comportamento similar já foi observado em outros vírus, como o HIV (Aids) e o influenza (gripe). Esse é o primeiro estudo a relacionar esse processo com o HCV.
Nos pacientes em que o vírus não se modificava após um primeiro contato com o sistema de defesa, o HCV era completamente eliminado após algumas semanas. Ou seja, sem a modificação das proteínas da superfície do vírus, o sistema de defesa pode produzir anticorpos que o identificam e destroem.
Na maior parte dos casos, variações genéticas no HCV apareceram somente após o contato inicial com os anticorpos. Esses pacientes desenvolveram infecções crônicas. As modificações ocorreram de 10 a 12 semanas após a contaminação.
O contato do HCV com os anticorpos estimula a mudança nas proteínas da superfície do vírus, permitindo que se esconda do sistema de defesa. Paradoxalmente, a defesa inicial do corpo impede a defesa posterior.
"Nós sabíamos que o corpo respondia à infecção logo no começo do processo de instalação da doença, mas em muitos pacientes o HCV é mais inteligente do que o sistema de defesa", disse Farci. "O HCV muda as proteínas da superfície assim que o anticorpos criados pelo paciente começam a atacar. O vírus se camufla e continua no corpo sem ser detectado."
O próximo passo, segundo a pesquisadora, será descobrir os tipos de mutação que ajudam o HCV a se esquivar do sistema de defesa. Com essa informação, seria possível obter novas formas de tratar e prevenir a hepatite C.
A cirrose e câncer hepático pós-HCV provocam a morte de 8.000 pessoas por ano nos EUA. No Brasil estima-se em 2,4 milhões de infectados, mas não há estatísticas sobre mortes.


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