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Energia misteriosa faz dez anos sem ganhar explicação
Força que faz Universo crescer de forma acelerada desafia físicos teóricos, e astrônomos ainda esperam "ajuda do céu"
Entidade física de natureza desconhecida -batizada de energia escura-, vai contra a gravidade, afastando as galáxias umas das outras
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma das maiores descobertas da história da astronomia
está completando uma década
neste ano, mas cientistas não
têm muita motivação para
comprar um bolo e tornar a data uma comemoração. Em
1998, dois grupos de pesquisa
independentes descobriram
que o Universo está se expandido de maneira acelerada -algo
que ninguém esperava. Passados dez anos, a força que move
esse fenômeno já tem um nome
-energia escura-, mas ninguém ainda sabe o que ela é.
"Não estamos mesmo muito
mais perto da resposta do que
estávamos antes", disse à Folha Robert Kirshner, astrônomo da Universidade Harvard,
de Cambridge (EUA). "Mas estamos bem convencidos hoje
de que essa coisa existe, e esse
sinal não se foi nos últimos
anos. Na verdade se tornou melhor, mais evidente."
Kirshner foi um dos astrônomos com papel crucial na descoberta de 1998. Ele inventou
uma maneira de analisar a luz
de supernovas (explosões de
estrelas) em galáxias que se
afastam da Terra a alta velocidade para estimar quão distantes elas estão. Sob liderança de
Adam Riess, ex-aluno de Kirshner, astrônomos usaram essa
técnica para fazer um grande
mapeamento do Universo,
mostrando que as galáxias mais
distantes estão se afastando cada vez mais rápido.
Os astrônomos demoraram
para acreditar no que estavam
vendo. Já se sabia desde 1929
que o Universo estava em um
movimento de expansão, que
tinha iniciado com o impulso
do Big Bang, a explosão que o
originou. Todos achavam, porém, que a força da gravidade
de toda a massa que existe no
cosmo acabaria freando esse
impulso alguma hora.
"No final de 1997, quando estavam saindo as primeiras análises de Adam Riess, ele me disse "Cuidado aí! Parece que nós
estamos obtendo massa negativa". Eu respondi então: "Você
deve estar fazendo algo errado.
Tem certeza de que não esqueceu de dividir por pi?"."
Mas não era um erro na fórmula. Os astrônomos ficaram
tão chocados quanto Isaac
Newton ficaria ao ver uma maçã caindo para cima. Não é possível perceber a energia escura
em pequena escala -maçãs
costumam cair para baixo aqui
na Terra-, mas na escala cosmológica essa força está agindo
contra a gravidade, afastando
as galáxias umas das outras.
Problema constante
Sem dados experimentais
que possam sugerir o que é a
energia escura, cientistas voltaram então para a teoria. Algo
que poderia explicar a energia
escura era um conceito antigo
criado por Albert Einstein. Sua
teoria da relatividade geral indicava que a gravidade deveria
fazer o Universo encolher, mas
o grande físico acreditava num
cosmo imóvel, parado. Sua solução foi postular uma força repelente para fechar as contas.
A essa nova força -uma tentativa de resolver o problema
"na marra"- o físico deu o nome de "constante cosmológica". O que a idéia implicava era
um tanto absurdo: o vácuo, ou
seja, o nada, conteria energia.
Aparentemente, na década
de 1930, Einstein acabou sucumbindo às provas de que o
Universo estava mesmo em expansão e se afastou do debate.
Após a descoberta da expansão
acelerada em 1998, porém, físicos ressuscitaram sua idéia: a
energia escura talvez seja a
constante cosmológica.
A essas alturas, a energia do
vácuo já não era uma idéia tão
absurda, e tinha sido até mesmo postulada na forma de "partículas virtuais" pelos físicos
quânticos. Com base nisso, então, teóricos calcularam qual
seria o valor da constante cosmológica se ela fosse mesmo o
impulso do "vazio quântico".
Só que a conta não fechou.
"A energia escura é ridiculamente pequena, e a energia do
vácuo teórica é ridiculamente
grande", explica Raul Abramo,
físico da USP (Universidade de
São Paulo). "Seria como casar
uma ameba com uma baleia."
Outros teóricos postulam
que a energia escura seja uma
outra força da natureza, uma
espécie de "antigravidade". Para isso, porém, precisaria haver
evidência de que ela varia no
espaço e no tempo. Em outras
palavras, seria preciso essa
energia não ser "constante".
Mas até onde a precisão dos telescópios permite ver, ela é.
Para sair da enrascada, físicos esperam agora a chegada de
dados de supertelescópios, mas
nada garante que imagens mais
precisas tragam novas idéias.
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