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Grupo cria programa que lê pensamento
Usando ressonância magnética, japoneses conseguiram decodificar a visão de uma pessoa examinando o seu cérebro
Aprimoramento pode levar nova tecnologia a ser capaz de registrar sonhos; método remete a debate sobre ética e privacidade no futuro
DA "NEW SCIENTIST"
As letras para as quais você
olha agora podem ser recriadas
com um programa de computador usando mapeamento cerebral por ressonância magnética. Em um feito inédito na neurociência, um grupo de cientistas japoneses anunciou pela
primeira vez uma tecnologia de
"leitura da mente" capaz de recriar imagens a partir de nada
mais do que puro pensamento.
O método foi apresentado
em estudo sexta-feira na revista "Neuron". Experimentos semelhantes já haviam sido feitos, mas as imagens observadas
eram "escolhidas" pelos cientistas e não produzidas diretamente pela máquina de leitura
cerebral, como feito agora.
O neurocientista Jack Gallant, autor dos primeiros trabalhos nessa linha, já havia
mostrado no início do ano que
era possível identificar qual
imagem, num grupo de várias,
estava sendo observada pelos
voluntários dos experimentos.
Para fazer isso, criou um programa capaz de comparar a atividade cerebral das pessoas durante a observação de um objeto com a atividade pré-registrada num "treinamento". O programa conseguia então apontar
qual imagem era a observada.
Agora, Yukiyasu Kamitani,
do Laboratório de Neurociência Computacional ATR, em
Kyoto, foi um passo além. Sua
equipe usou uma imagem de
atividade cerebral obtida em
uma máquina de ressonância
magnética funcional para recriar imagens em preto-e-branco a partir do zero.
"Ao analisar sinais cerebrais
quando alguém vê uma imagem, podemos reconstruí-la",
afirma Kamitani. Isso significa
que a leitura da mente poderia
ser usada para "extrair" qualquer coisa sobre a qual uma
pessoa está pensando, sem os
cientistas terem a menor idéia
do que poderá vir.
Pixels mentais
"É absolutamente espantoso", comenta John-Dylan Haynes, do Instituto Max Planck
para Cognição Humana, de
Leipzig (Alemanha). "Isso é um
passo realmente importante."
O experimento de Kamitani
começa com uma pessoa observando uma seleção de imagens
compostas de quadrados brancos ou pretos numa grade de
dez por dez. Ao mesmo tempo,
mapeia seus cérebros. Cada
quadrado é como um pixel, um
ponto na tela de computador.
O programa, então, acha os
padrões de atividade cerebral
que correspondem a cada pixel.
Depois, a pessoa se senta na
máquina de ressonância funcional e passa a olhar para figuras novas. É aí que um outro
programa compara essa nova
leitura com a anterior e reconstrói o quadro de pixels.
A qualidade de imagens obtida no experimento era um pouco baixa, mas foi suficiente para
identificar as letras da palavra
"neuron" (neurônio em inglês).
Números e formas também foram mostrados às pessoas e puderam ser reconstruídos da
mesma maneira (veja quadro à
direita). Já vale como uma prova de princípio, diz Haynes .
Como a ressonância magnética funcional tem se aprimorado muito nos últimos anos, Kamitani afirma que seu quadro
pode no futuro ser produzido
com um número maior de pixels, produzindo imagens com
muito mais qualidade.
O próximo passo dos cientistas é tentar reconstruir imagens sobre as quais as pessoas
estão apenas pensando, sem
vê-las diretamente. Seria então
possível "fazer a filmagem de
um sonho", diz Kamitani.
Haynes diz que isso pode levantar questões éticas no futuro. Publicitários, por exemplo,
poderiam tentar ler os pensamentos dos transeuntes para
adequar seus anúncios a elas.
Ladrões de sonhos
"Isso [a nova pesquisa] não
leva necessariamente àquilo,
mas o espírito do que está sendo feito está alinhado com com
a leitura cerebral e com as aplicações que viriam com ela",
afirma o neurocientista.
"Com uma técnica que permite ler o que as pessoas pensam, nós claramente precisamos de diretrizes éticas sobre
quando e como isso pode ser
feito", diz. "Muitas pessoas
querem que seja possível ler
suas mentes -uma pessoa paralisada, por exemplo. Mas não
deveria ser permitido fazer isso
com um propósito comercial."
O próprio Kamitani se diz
ciente dos potenciais abusos
que a tecnologia poderia propiciar. "Se a qualidade de imagens melhorar, poderia haver
um sério impacto em nossa privacidade", diz. "Nós teremos
que discutir com muitas pessoas -não apenas os cientistas- sobre como aplicar essa
tecnologia.
(CELESTE BEVIER)
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