São Paulo, segunda-feira, 16 de março de 2009

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Superobservatório "migra" para os EUA

Experimento de raios cósmicos instalado na Argentina terá segunda versão no Colorado com sete vezes o seu tamanho

Latino-americanos temem que sítio inicial do projeto se torne coadjuvante em pesquisa internacional que pode levar ao Prêmio Nobel

ANDRÉ LOBATO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA EM MALARGÜE (ARGENTINA)

Após ter destacado um grupo de brasileiros como protagonistas de uma das descobertas recentes mais importantes da física, o Observatório Pierre Auger, na Argentina, pode perder a capacidade de se manter na linha de frente da ciência.
Em 2007, essa enorme rede de detectores nas planícies do Estado de Mendoza deu aos cientistas uma ideia mais clara sobre a origem dos misteriosos raios cósmicos de ultraenergia, partículas que bombardeiam a atmosfera da Terra.
O Auger é hoje uma colaboração de 17 países. Seus planos de ampliação, porém, preveem a instalação apenas de um segundo campo de detectores, nos EUA. E cientistas do sítio capitaneado pela ala latino-americana do grupo temem agora que o aparato na Argentina fique para trás na capacidade de gerar conhecimento inédito.
Ocupando uma área de 3.000 km2 em Mendoza, o sítio Sul do Auger teve seu auge ao descobrir que raios cósmicos ultraenergéticos não são um fenômeno espalhado igualmente por todo o Universo. Eles vêm de lugares específicos, e os principais suspeitos são as galáxias com chamados núcleos ativos, onde a gravidade de buracos negros gigantes confere grande energia à matéria em volta.
Dando sequência ao projeto original de observatórios nos dois hemisférios, a colaboração tem o projeto do sítio Norte quase pronto, e começou a corrida atrás de financiadores. Esse outro campo de detectores, no Colorado (EUA), terá sete vezes o tamanho do argentino.
A disparidade de tamanho criou certa frustração nos cientistas alocados no sítio Sul da colaboração. Após terem conquistado seu lugar na física do século 21, temem que seu experimento se torne obsoleto frente ao grande irmão do norte.
Na opinião de Angela Olinto, da Universidade de Chicago -que está no comando do sítio americano- "se você pensar na ciência, o melhor é fazer [a ampliação] no Norte". Para ela, o sítio Sul deve se voltar a raios cósmicos mais fracos, enquanto o Norte ficará com os de altíssima energia: pouco estudados e mais próximos de render um estudo candidato ao Nobel.
Rubén Squartini, físico que trabalha no sítio argentino, vê com desconfiança a diferença entre os dois observatórios.
"Tenho uma percepção muito subjetiva: a de que depois que construam o Auger Norte, não vão dar dinheiro ao Sul", diz.
Carlos Escobar, chefe do grupo brasileiro no sítio Sul, reconhece que o Norte é necessário ao grupo como um todo, mas, como Olinto, diz que Mendoza ainda tem algo a oferecer.
"Temos que mostrar unidade, senão nenhuma instituição vai nos financiar", diz. Ele defende, porém, que uma parte dos US$ 120 milhões necessários ao sítio Norte siga para o Sul. Em vez de ter 21 mil km2, o Norte passaria a ter 18 mil km2 e o sítio da Argentina ficaria com mais 2.000 km2.
Ronald Shellard, co-presidente do conselho da colaboração do Auger, diz que isso permitiria ao grupo produzir mais ciência de ponta enquanto o sítio Norte não fica pronto.
Outra possibilidade de ampliar o Auger Sul sem construir novos detectores seria aumentar o espaço entre os instrumentos. A rede de 3.000 km2, passaria a ter 5.000 km2, estima Hans Klages, alemão integrante da colaboração. Olinto diz que uma das prioridades é manter as novas gerações de doutores em física em atividade. "Eles precisam ter coisas novas para descobrir", afirma.


Folha Online
Assista a um sobrevôo virtual no observatório
www.folha.com.br/090721



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