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Ibama admite extinções em Belo Monte
Funcionário diz que há chance de "quatro ou cinco" espécies de peixes sumirem em usina, mas minimiza impacto total
Especialistas em fauna das
águas do Xingu apontam
que estudo de impacto
incluiu como amazônicas
até espécies da Argentina
REINALDO JOSÉ LOPES
DA REPORTAGEM LOCAL
"Quatro ou cinco espécies de
peixes têm potencial de se extinguir, mas assumimos esse
risco. Para o conjunto da Amazônia, faria muito mais mal
construir 25 termelétricas do
que a usina hidrelétrica de Belo
Monte", afirma o biólogo Antonio Hernandes, do Ibama.
Coordenador de infraestrutura de energia elétrica do órgão ambiental, Hernandes falou à Folha em resposta às críticas feitas por um grupo de ictiólogos -biólogos especializados em peixes- ao estudo de
impacto ambiental que tornou
possível o licenciamento e posterior leilão da usina.
Entre outros problemas, esses cientistas apontam a imperícia na identificação das espécies nativas do trecho do rio
Xingu que receberá a usina.
Os bichos teriam sido igualados erroneamente a peixes que
só existem em outras bacias hidrográficas. Subestima-se, assim, a presença no Xingu de espécies que ainda nem ganharam nome científico.
Também reclamam que houve desleixo no cadastro dos espécimes coletados em museus,
o que pode atrapalhar o estudo
da diversidade de espécies
quando seu habitat estiver alterado ou mesmo desaparecido. E afirmam que o número
real de peixes sob risco de sumir pode ser muito maior do
que quatro ou cinco.
O Ibama, porém, discorda.
"Análise crítica"
Os ictiólogos assinam um capítulo de uma análise crítica do
estudo de impacto ambiental
de Belo Monte. Entre eles está
Paulo Buckup, do Museu Nacional da UFRJ (Universidade
Federal do Rio de Janeiro).
"Do meu ponto de vista, o
principal problema é que não é
possível verificar as identificações dos peixes, o que é fundamental numa fauna em que
quase metade das espécies ainda não foram descritas. É como
inocentar ou condenar uma
pessoa sem apresentar as provas materiais do crime", diz.
Buckup lembra que numerar
os espécimes, associando-os de
forma precisa ao local onde foram coletados, é a "premissa
básica aceita pelos cientistas"
para estudos sobre biodiversidade. Hernandes, do Ibama, diz
que o material "não foi jogado
fora", tendo sido depositado,
segundo ele, no Museu Paraense Emilio Goeldi, em Belém.
"É um problema menor. Há
coisas mais graves no estudo de
impacto, até porque mandaram
exemplares aqui para o museu", diz Flávio César Thadeo
de Lima, pesquisador do Museu de Zoologia da USP que
também participou da análise.
De uma lista de 14 espécies
citadas pelo estudo da usina,
por exemplo, cinco seriam, na
verdade, bichos que nem ocorrem na Amazônia, tendo sido
registrados em lugares tão distantes quanto a Bahia, o Uruguai e a Argentina. As demais
ocorrem fora da bacia do Xingu,
levantando fortes suspeitas de
identificação incorreta.
Para Lima, um dos problemas mais graves é que o estudo
de impacto não chama a devida
atenção para duas espécies que
já constam da lista nacional de
espécies sob risco de extinção,
o pacu-capivara e o carismático
cascudo-zebra, sucesso entre
aquaristas (leia texto abaixo).
"Eles só existem na Volta
Grande do Xingu", diz o ictiólogo, referindo-se à área que será
mais afetada pela usina. Hernandes rebate: "Não sabemos
se essas espécies realmente só
existem lá".
Para o funcionário do Ibama,
é provável que "90% das espécies" únicas da Volta Grande se
encontrem em ambientes similares no rio Iriri, que serão protegidos como contrapartida ao
impacto de Belo Monte.
Não é o que os pesquisadores
afirmam. "Não sei qual o tamanho da nossa ignorância, mas
sei que ela é bem grande", diz
Lima. "Teremos um programa
de levantamento das espécies
antes de qualquer obra, nos
próximos três ou quatro anos,
então eles poderão tentar comprovar isso", diz Hernandes.
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