São Paulo, quarta-feira, 16 de outubro de 2002

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POLÍTICA CIENTÍFICA

Rede paulista começa a funcionar com equipamento emprestado; no Rio, falta verba para insumos

Dólar alto faz projeto proteoma empacar

CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

A alta do dólar está atrapalhando a realização de projetos proteoma no país. Em São Paulo, a implantação da rede de proteômica está atrasada devido à falta de dinheiro para compra de equipamento. No Rio, onde a rede já existe, falta verba para comprar reagentes e mantê-la operando.
A rede paulista, financiada pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), deve começar a funcionar nas próximas semanas. A idéia original era ter convocado nove laboratórios em julho, por meio de edital. Mas apenas um começará a fazer o trabalho.
Ele será instalado no LNLS (Laboratório Nacional de Luz Síncrotron), em Campinas, e funcionará com equipamentos cedidos temporariamente, para demonstração, pelas empresas Micromass (britânica) e Applied Biosystems (americana).
Com a suspensão das importações de equipamentos pela Fapesp, determinada em setembro devido à alta do dólar, a compra dos espectrômetros de massa para o proteoma não pôde ser realizada. Cada equipamento custa de US$ 500 mil a US$ 800 mil.
Segundo Rogério Meneghini, coordenador da Rede de Biologia Molecular Estrutural da Fapesp, após várias reuniões com representantes das empresas, decidiu-se que dois espectrômetros e uma máquina preparadora de amostras virão "a custo zero" para o laboratório, em esquema de empréstimo, por seis meses.
A expectativa da fundação é que, nesse período, as incertezas sobre o câmbio estejam resolvidas e que a Fapesp possa lançar um edital convocando os laboratórios interessados no proteoma.
Segundo o coordenador da rede paulista, Carlos Bloch Jr., da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), os equipamentos chegam ao Brasil na próxima segunda-feira.
A rede fluminense, formada por cinco laboratórios, saiu na frente da paulista, mas enfrenta agora o "day after": conseguiu comprar os espectrômetros antes da desvalorização do real e começar a pesquisa, só que, agora, não tem dinheiro para adquirir gel de eletroforese bidimensional, insumo necessário para a análise molecular.
"É como se você fosse pintar uma parede e tivesse comprado as broxas, mas não tivesse tinta", compara o biólogo Elias Walter Alves, da Uenf (Universidade Estadual do Norte Fluminense), um dos coordenadores da rede.
Como o material é perecível, ele não pode ser comprado em grande quantidade. Os pesquisadores do Rio têm estoque para mais dois ou três meses e, segundo Alves, não há perspectiva imediata de novas compras. Para piorar, as verbas para pesquisa no Estado estão congeladas.
"Estamos atrasados, mas tocando [o projeto]", afirma Alves. "O que nos preocupa não é o dia de hoje, mas o amanhã."

Próximo passo
O proteoma, estudo das interações entre todas as proteínas que compõem um organismo, é o passo lógico seguinte ao sequenciamento do genoma (o conjunto dos genes). Isso porque as proteínas, codificadas nos genes, são as moléculas que efetivamente fazem tudo num ser vivo. Enquanto o genoma fornece o manual de instruções para a produção de um animal ou planta, com a análise do proteoma é possível saber como essas instruções são executadas nas diferentes fases da vida.
Os espectrômetros de massa servem para medir o peso de moléculas. As técnicas que permitiram seu uso para estudar proteínas renderam o Nobel de Química de 2002 para o americano John Fenn e o japonês Koichi Tanaka.
São equipamentos elaborados, que carregam eletricamente as proteínas e as forçam a atravessar um campo de vácuo. Quanto mais leve, menor o chamado "tempo de vôo" de uma proteína na câmara. Tal informação, combinada à da carga, permite determinar a "assinatura" da molécula.
A rede paulista de proteômica trabalharia com organismos que já tiveram seu DNA sequenciado pelos projetos genoma financiados pela Fapesp. A Folha apurou que a diretoria do órgão de fomento paulista está apostando no proteoma para obter respostas práticas sobre o funcionamento desses organismos, como a bactéria Xylella fastidiosa, causadora da doença do amarelinho, que afeta os laranjais do Estado.
A estréia no proteoma será com a bactéria Xanthomonas, agente do cancro cítrico, e com o café, cujo genoma está sendo sequenciado em parceria com a Embrapa.



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