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São Paulo, terça-feira, 16 de dezembro de 2003

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CÉLULAS-TRONCO

Projeto que levanta proibição de pesquisa com embrião é bem recebido, mas bioeticista recomenda cautela

Cientistas aprovam mudança em projeto

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Para cientistas brasileiros, a alteração no projeto de lei sobre biossegurança que elimina a proibição de usar embriões humanos em pesquisa é um avanço no combate a várias doenças, em especial as de origem genética, com o uso das células-tronco embrionárias. Mas ao menos um bioeticista pede prudência e diz temer o que isso possa acarretar para o status jurídico dos embriões.
No novo texto para a lei, o substitutivo do deputado Aldo Rebelo (PC do B-SP), relator do projeto, foi retirado o inciso IV do artigo 8º da atual Lei de Biossegurança, segundo o qual é vedada "a produção, armazenamento ou manipulação de embriões humanos destinados a servir como material biológico disponível".
A Folha adiantou ontem a mudança defendida por Rabelo. Se aprovada no Congresso, permitiria as pesquisas com células-tronco embrionárias. Elas são encontradas em embriões de poucos dias de vida e são verdadeiros curingas biológicos, podendo assumir a forma de qualquer tecido do organismo. Sua obtenção, porém, exige a destruição do embrião do qual são retiradas, o que levanta dúvidas éticas sobre o seu uso.
Para o médico Ricardo Ribeiro dos Santos, que estuda células-tronco adultas (retiradas da medula óssea), os benefícios da técnica justificam o procedimento. "As clínicas de fertilização in vitro produzem muitos embriões que nunca vão ser usados. Entre jogá-los na lata do lixo e usá-los para terapia, você não tem o que fazer, a escolha é óbvia", afirma.
O uso das células-tronco embrionárias poderia ter papel importante em doenças de origem genética, nas quais células-tronco adultas do próprio doente não teriam efeito por ter o mesmo DNA, avalia Ribeiro dos Santos.
"Eu acho que é um superavanço", diz Lygia da Veiga Pereira, pesquisadora do Instituto de Biociências da USP. "É muito importante que haja permissão para que trabalhemos com células-tronco embrionárias."
Segundo a bióloga, a autorização daria ao Brasil vantagem competitiva no cenário científico internacional. "Nós, por exemplo, no nosso laboratório, já trabalhamos com células-tronco embrionárias de camundongo. Caso fosse permitido, poderíamos começar a trabalhar com células humanas imediatamente."
Para o bioeticista e padre Leo Pessini, do Centro Universitário São Camilo, em São Paulo, o projeto de lei mostra que, "no fundo, são irreconciliáveis" as visões de mundo de grande parte dos cientistas e das pessoas que defendem os embriões.
"Numa linha utilitarista, você pode até dizer que tudo pode. Mas, se formos mais prudentes, podemos perceber que o embrião não é uma coisa e não pode ser tratado como coisa", afirma. Pessini defendeu o aprofundamento das pesquisas com células-tronco adultas e criticou o projeto: "Toda legislação que enfraqueça a proteção ao embrião humano é perigosa e deveria ser evitada".
A bióloga Mayana Zatz, da USP, disse que "só poderia dar os parabéns" à proposta de Rebelo. "O potencial de tratamento para inúmeras doenças neuromusculares, o diabetes e o mal de Parkinson é gigantesco", diz Zatz.
A pesquisadora disse que comitês de ética podem estabelecer limites aceitáveis para a pesquisa na área e que um caminho seria o uso de embriões de clínicas de fertilização que já não podem gerar uma gravidez, mas ainda são capazes de ser fonte de células-tronco. Para Zatz, a técnica não precisa estar acoplada à clonagem terapêutica, que usaria um embrião clonado do doente.
(REINALDO JOSÉ LOPES)


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