|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"Circo do fim do mundo" acaba entre acusações e lágrimas
DO ENVIADO A BALI
É difícil transmitir a tensão
que se viu e sentiu em Bali na
última semana das negociações
do Mapa do Caminho. A melhor expressão desse sentimento talvez tenha sido a do secretário-executivo da Convenção do Clima, o holandês Yvo de
Boer: diante do impasse na plenária, exausto após uma reunião que fora interrompida às
3h30 da manhã e reiniciada às
8h, ele pôs a mão no rosto, chorou e saiu da sala.
Foi uma reta final melancólica para um encontro que tivera
início, no dia 3, como uma grande festa. Cerca de 15 mil pessoas compareceram ao distrito-resort de Nusa Dua, na paradisíaca (e insuportavelmente
quente) ilha indonésia.
Animados pelas evidências
compiladas pelo IPCC (em tese, à prova de contestação pelos
governos), os participantes da
COP-13 acharam que uma resposta adequada ao aquecimento global era algo garantido. Esbarraram na realidade política
e no processo inerentemente
lento das Nações Unidas.
Na primeira semana de COP,
Bali viu de tudo: de lobistas de
um nascente mercado de carbono tentando fazer dinheiro
com proteção de florestas até
protestos de ONGs que aconteciam sempre ao meio-dia. Num
hotel vizinho, simpósios discutiam desde o impacto dos biocombustíveis no clima até tecnologias de captura de carbono.
No centro de imprensa,
ONGs chamavam jornalistas
para viagens gratuitas (o governo da Indonésia também fez isso, mas só para a imprensa estrangeira) e um certo Lorde
Mockton, que se apresentava
como conselheiro científico da
ex-premiê britânica Margareth
Thatcher, pregava contra "a
fraude científica do IPCC".
Vestindo um terno azul fora
de moda e gravata (enquanto
diplomatas aderiam à moda das
blusas de batique), Mockton
oferecia entrevistas para promover sua visão "cética" do
efeito estufa e atacar o IPCC e
Al Gore. Depois da apresentação demolidora de Gore, na
quinta, ele não foi mais visto.
Fóssil do século
O clima começou a azedar no
fim-de-semana passado, quando os EUA lançaram sua ofensiva para melar a COP. A tensão
chegou ao auge na quinta-feira,
quando o ministro alemão do
Meio Ambiente, Sigmar Gabriel, e o comissário europeu
para o Ambiente, Stavros Dimas, ameaçaram boicotar a
reunião das grandes economias
que Bush convocara para 2008.
Na madrugada de sábado a
resistência americana foi vencida. Pela manhã, foi a vez de o
G77 reclamar. O bloco das nações em desenvolvimento, que
inclui o Brasil, pediu para que
fosse mantida a palavra "comparabilidade" para os esforços
de redução dos países desenvolvidos (leia-se os americanos) e exigiu que os compromissos de financiamento,
transferência de tecnologia e
capacitação dos países pobres
pelos ricos fossem também
mensuráveis e verificáveis.
Nesse momento, Ban Ki-moon interveio na plenária.
Daí em diante, seguiram-se trocas de acusações, com os chineses culpando De Boer (que chorou) e os sul-africanos acusando os EUA de jogo sujo.
Diplomacia à flor da pele.
(CA)
Texto Anterior: Em Bali, ONU rascunha acordo do clima Próximo Texto: O cérebro não tem cor Índice
|