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ARTIGO
Tragédia foi gestada durante anos de erros
OTAVIO DURÃO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Após quase sete meses do acidente que vitimou 21 engenheiros
e técnicos, o relatório sobre o acidente com o VLS-1 foi finalmente
divulgado. Não é um prazo excessivo, considerando que ele é profundo e o primeiro com essa
abrangência.
A comissão responsável realizou um bom trabalho com o material de que dispunha. Ela se tornou mais representativa com a inclusão de membros externos da
comunidade científica e das famílias das vítimas. A metodologia de
dividi-la em quatro subcomissões
(material/sistema, meteorologia,
fatores humanos e operação)
também a fez mais efetiva.
Seus resultados e conclusões são
um alerta. Até a falta de alguns resultados e conclusões, que se poderia esperar, também o é. O fato
de não se poder concluir o que gerou a ignição do detonador de um
propulsor do primeiro estágio do
foguete, após um trabalho tão minucioso, é revelador.
Revela a insegurança que cerca
o projeto do VLS como um todo e
também a falta de controle, dados
e informações, e reforça as conclusões de falta de organização.
Tais conclusões -principalmente nos fatores operacionais e humanos- podem surpreender
quem não está familiarizado com
a condução do programa, mas
não quem convive com ele.
O que aconteceu em Alcântara
foi conseqüência de problemas
que persistem há vários anos. Não
foi um problema somente localizado e datado, mas sim uma evidência trágica de problemas
maiores e anteriores.
O que iniciou indevidamente a
ignição do primeiro estágio do
VLS-1 foi gerado durante anos pela falta de planejamento, de objetivos claros e definidos e de uma
centralização do processo de decisão no programa. Essas indefinições se manifestam em orçamentos sempre insuficientes, contingenciamentos e incertezas, e na
fuga de pessoal qualificado.
Um relatório como esse não
tem valia se não tiver conseqüências. Ele abre, e de fato até recomenda implicitamente, a oportunidade para as modificações que
são necessárias na condução do
programa -explicitando e reforçando seus objetivos, sejam eles
científicos ou de aplicações, civis
ou militares, e criando uma estrutura hierárquica que seja de fato, e
não somente de direito, responsável por sua condução e passível de
cobranças pela sociedade.
Otavio Durão, 55, é doutor em engenharia pela Penn State University (EUA)
e engenheiro do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (Inpe) desde 1986
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