São Paulo, sábado, 17 de abril de 2004

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ASTRONOMIA

Localizado nos Andes chilenos, Soar deve oferecer imagens com qualidade igual ou até superior à do Hubble

Brasil ganha seu principal telescópio hoje

Divulgação LNA
A cúpula do telescópio Soar, que será inaugurado hoje em Cerro Pachón, Chile


SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma pequena cerimônia festiva para um punhado de astrônomos, um salto revolucionário para a astronomia brasileira. Trata-se de uma boa definição do evento que acontece hoje em Cerro Pachón, Chile, durante a inauguração do telescópio Soar.
Pode soar pretensioso, mas esse novo centro de observações astronômicas promete trazer novas e empolgantes possibilidades de pesquisa para cientistas brasileiros. Construído pelo Brasil em parceria com duas instituições americanas, o sistema traz uma série de inovações tecnológicas. E a qualidade das imagens que ele poderá obter, com seu espelho de pouco mais de quatro metros, rivalizará até com a ofertada pelo Telescópio Espacial Hubble.
"Estimamos que nos próximos 30 anos ele deve estar entre os melhores telescópios instalados na superfície do planeta", diz João Steiner, astrônomo do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da USP e presidente do comitê diretor do Soar (sigla em inglês para "Pesquisa Astrofísica Austral").
É o segundo grande projeto internacional de construção de telescópios do qual o Brasil participa. Antes dele, o país investiu na construção do par de telescópios Gemini, instalados no Havaí (EUA) e no Chile. Mas a participação nacional no consórcio era de apenas 2,4%, o que garante à pesquisa brasileira apenas seis dias de observação por ano - insuficientes para atender à demanda.
No caso do Soar, a participação brasileira é majoritária. Foram investidos US$ 12 milhões, o equivalente a 34% do custo total. A maior parte (US$ 10 milhões) veio do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), e US$ 2 milhões foram despendidos pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
Os outros 66% foram divididos entre duas universidades dos Estados Unidos, a da Carolina do Norte e a de Michigan. Por conta de sua posição majoritária, o Brasil teve o privilégio de indicar o presidente do comitê diretor.
O Chile não chegou a investir recursos no projeto, mas, por ceder seu território para a instalação do telescópio, o país tem direito a 10% do tempo disponível para pesquisa com o sistema.
O local foi escolhido por suas condições atmosféricas favoráveis às observações, numa região desértica e de ar rarefeito.

Contagem regressiva
A cerimônia de inauguração é apenas um ato simbólico. As primeiras imagens do Soar, instalado a 2.738 metros de altitude, nos Andes chilenos, na verdade foram obtidas no mês passado. "É a chamada primeira luz de engenharia", explica Steiner. "As imagens são obtidas, e a partir delas os técnicos passam a fazer ajustes nos equipamentos para atingir as especificações de qualidade determinadas pelo projeto."
Essa fase de comissionamento pode levar um bocado de tempo. "No caso do Gemini, por exemplo, levou mais de um ano", afirma o pesquisador. "Mas, para o Soar, as coisas estão indo muito bem, e achamos que será mais depressa. Esperamos começar a fazer ciência dentro de seis meses."
O potencial para os estudos é vasto, segundo Steiner. "O Soar pode oferecer contribuições fundamentais sobre origem e evolução do Universo, sobre origem, evolução e estrutura de galáxias, estudos de buracos negros e supernovas, planetas extra-solares, origem dos elementos químicos -todos temas bastante atraentes atualmente", ele diz. "Mas eu acredito que as coisas mais interessantes são aquelas de que a gente ainda nem suspeita."
Com seus sistemas de óptica ativa (que mantêm a conformação do espelho na posição ideal) e óptica adaptativa (que compensa pelas distorções atmosféricas), o Soar será um dos instrumentos mais poderosos à disposição dos pesquisadores brasileiros. O país terá cerca de 112 dias por ano, lá.
As novas possibilidades devem elevar ainda mais o já expressivo trabalho dos astrônomos nacionais, que hoje respondem por aproximadamente 2% da produção científica mundial na área.
As propostas de uso do telescópio por astrônomos brasileiros serão recebidas pelo LNA (Laboratório Nacional de Astrofísica).


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