São Paulo, sexta-feira, 17 de setembro de 2004

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ELEIÇÕES NOS EUA

Candidatos à Presidência americana utilizam embates científicos para polarizar debate na campanha

Ciência vira cabo eleitoral de Bush e Kerry

Charles Dharapak/AP
Presidente americano, George W. Bush discursa durante campanha


DA REDAÇÃO

As duas principais revistas científicas do mundo, a britânica "Nature" (www.nature.com) e a americana "Science" (wwwsciencemag.org), publicaram nesta semana respostas de dois candidatos à Presidência dos EUA - o atual presidente, o republicano George W. Bush, e o senador democrata John Kerry- sobre como a ciência será encarada em seus virtuais mandatos.
À primeira vista, tem-se a impressão de que a ciência será alçada à posição prioritária do governo seja qual for o eleito. Um exemplo é o apoio de ambos os candidatos à duplicação do orçamento anual dos NIH (Institutos Nacionais de Saúde, na sigla em inglês), a principal fonte de verba para a pesquisa no país.
Os dois também concordam que a entrada de cientistas e estudantes estrangeiros no país tem sido prejudicada pela nova política de vistos, mais severa desde os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 -ainda que o presidente defenda o sistema e diga que há "sucessos notáveis na redução de atrasos" sem prejuízo à segurança nacional.
Porém, passada a primeira impressão, percebe-se o uso crescente de questões relativas à ciência como "cabos eleitorais ideológicos", capazes de gerar reações apaixonadas dos eleitores, tanto democratas quanto republicanos.
Kerry é quem aparentemente sabe aplicar melhor o valor da ciência como ferramenta de persuasão. Em julho, na convenção do Partido Democrata, o senador usou a expressão "célula-tronco" 20 vezes, enquanto "desemprego" mereceu apenas nove menções. O recado é dirigido à clara oposição de Bush à clonagem terapêutica e ao uso de células-tronco embrionárias na pesquisa médica.
Na "Science", Kerry promete suspender a moratória aos financiamentos públicos a trabalhos na área. Já Bush sustenta que dinheiro de impostos não deve ser usado para "encorajar ou endossar a destruição de embriões humanos vivos", etapa obrigatória no processo de obtenção das células-tronco embrionárias.
Outro assunto que, acreditam os políticos, ajudará a definir votos é a responsabilidade dos Estados Unidos, o maior poluidor do mundo, no aquecimento global.
Em 2001, dois meses depois de assumir o cargo na Casa Branca, Bush rejeitou o Protocolo de Kyoto, acordo internacional que prevê a redução da emissão de gases-estufa na atmosfera, ao afirmar que seria prejudicial à economia americana. O ato norteou a política ambiental de sua administração e recebeu críticas de ambientalistas, cientistas e nações envolvidas com o protocolo.
Na campanha de reeleição, Bush ainda tenta convencer os eleitores de que sua decisão foi acertada, e que sistemas empresariais que diminuam a emissão de poluentes sem frear a produção são viáveis. Seu opositor tenta polarizar a questão: "Levaremos os Estados Unidos de volta à mesa de negociação internacional". Porém, fica só na sugestão, sem afirmar de forma consistente a ratificação do acordo caso eleito.

Poder nuclear
Três anos depois de as torres gêmeas do World Trade Center desmoronarem em Nova York, o desenvolvimento de armas nucleares volta à pauta americana. Na "Nature", Bush defende a retomada da "infra-estrutura nuclear atrofiada desde o fim da Guerra Fria" -Kerry prefere manter a estrutura existente, sem apoiar a criação de uma nova geração de armas nucleares.
Já a manipulação do lixo radioativo é uma das questões quentes da campanha. Há 20 anos, os americanos discutem onde armazenar o material, e a montanha Yucca, no Estado de Nevada, é o destino apropriado, dizem os republicanos -posição oposta à dos democratas. Segundo um artigo da "Nature" que acompanha as entrevistas, o local não é tão seguro quanto professa Bush, nem tão arriscado como defende Kerry. Para a revista, a verdade está em um ponto intermediário.


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