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BIOQUÍMICA
Pesquisadores de São Paulo e do Paraná querem desenvolver anticoagulantes a partir de proteínas do animal
Veneno de aranha pode atacar trombose
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma aranha minúscula que é
um problema de saúde pública no
Paraná, causando cerca de 3.000
acidentes por ano, agora está colaborando com a ciência e poderá
ser a nova fonte de medicamentos
contra problemas de coagulação
no sangue.
Pesquisadores da UFPR (Universidade Federal do Paraná) e da
Unifesp (Universidade Federal de
São Paulo) isolaram enzimas (um
tipo de proteína) no veneno da
aranha marrom que poderão auxiliar no tratamento de tromboses
e problemas semelhantes de obstrução dos vasos sanguíneos.
"Identificamos enzimas que
agem sobre os vasos sanguíneos e
causam a hemorragia, destruindo
os vasos e componentes do plasma necessários à coagulação",
afirma o bioquímico Rafael Bertoni da Silveira, de Curitiba, aluno
de pós-graduação da Unifesp.
A equipe de cientistas -que
também contou com o orientador
de Bertoni na Unifesp, Carl Peter
von Dietrich, seu co-orientador
na UFPR, Silvio Sanches Veiga, e
Helena Bonciani Nader, também
da Unifesp-, publicou quatro
artigos em revistas científicas internacionais sobre a pesquisa.
Um artigo faz a descrição estrutural da glândula de veneno da
aranha. Dois outros trabalhos
descrevem a identificação das
proteases, isto é, das enzimas que
degradam outras proteínas, em
extratos das glândulas de veneno
da aranha. E ainda outro descreve
a maneira como ocorre o dano ao
vaso sanguíneo pelo veneno.
O objetivo inicial do estudo era
entender o processo de ação do
veneno no organismo humano.
Piores venenos
As aranhas marrons, do gênero
Loxosceles, são as mais perigosas
entre as aranhas pequenas -seu
corpo chega no máximo a um
centímetro. Em torno de 80% dos
acidentes ocorrem dentro de casa, pois elas são encontradas em
armários, roupas e sapatos. Os
forros de madeira comuns nas casas das regiões de imigração européia no Paraná são um dos locais onde se reproduzem com facilidade. "Há casas abandonadas
com 200, 500 aranhas", afirmou
Bertoni à Folha, por telefone.
Justamente por serem pequenas, a pesquisa com elas é difícil.
Para conseguir doses de veneno
em quantidade suficiente para a
pesquisa é necessário "ordenhar"
centenas de aranhas -por meio
de choques, ou matando-as para
extrair a glândula de veneno. Os
pesquisadores usaram o veneno
da espécie predominante no Paraná, a L. intermedia.
A pessoa picada pode nem perceber na hora, dado o pequeno
ferrão da aranha. O veneno leva
de 12 a 24 horas para agir. A vítima sente, então, dor semelhante à
de uma queimadura. Forma-se
uma bolha no local e uma úlcera
de cicatrização difícil. A urina pode ficar escura. Nos piores casos,
surge insuficiência renal.
"O mecanismo da lesão ainda
não foi todo elucidado", diz Bertoni. A pesquisa agora está continuando com um viés mais aplicado, "mais de biotecnologia", com
a clonagem das enzimas e estudo
das suas características.
O uso de enzimas purificadas
retiradas de toxinas animais como medicamento já tem como
precedentes trabalhos feitos com
veneno de cobra. Mas os aracnídeos não ficam atrás, pois seus venenos podem ter ações distintas nas vítimas, ajudando com isso na compreensão de funções do organismo ou originando terapias.
Um bom exemplo é a aranha armadeira (Phoneutria nigriventer). A picada dessa espécie logo provoca dor local intensa, pois ele age no sistema nervoso, interferindo nos canais de transmissão do impulso nervoso.
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