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BIOLOGIA
Pesquisadores do RS criam método de baixo custo para produzir inseto geneticamente modificado para pesquisa
Trio improvisa mosca transgênica barata
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Quem não tem cão, caça com
gato -até para fazer moscas
transgênicas. E os proverbiais gatos estão ameaçando tirar o emprego de seus concorrentes caninos: um grupo de pesquisadores
do Rio Grande do Sul acaba de desenvolver um método improvisado para obter esses insetos a custo
muito mais baixo.
O esforço vem da Universidade
Federal de Santa Maria e está descrito num artigo publicado na última edição da revista científica
da Sociedade Brasileira de Genética, "Genetics and Molecular Biology" (www.scielo.org/gmb).
O sucesso é mais fruto de inventividade do que de alta tecnologia.
Em dado momento, por exemplo,
os pesquisadores descrevem o
uso de um "adesivo instantâneo
cianoacrílico", mas logo desfazem
a impressão de sofisticação, com
uma descrição mais precisa, entre
parênteses: SuperBonder.
"A metodologia nos nossos experimentos é basicamente a mesma. O que apresentamos de novo
é a improvisação de um micromanipulador com um pedaço de
microscópio velho", conta Élgion
Lucio da Silva Loreto, um dos três
condutores da pesquisa, com Maríndia Deprá e Lenira Maria Nunes Sepel. "Outra coisa que fizemos foi improvisar um sistema de
epifluorescência, colocando uma
fonte de laser em um estereomicroscópio comum."
A fabricação de moscas drosófilas transgênicas é importante para entender o papel de genes no
organismo. Loreto e suas colegas
trabalham especificamente com a
introdução de transposons em
seu código genético. O nome feio
pode meter medo, mas não é nada
demais; ele designa um tipo de gene que é basicamente um atleta
saltador, capaz de trocar de posição dentro do genoma.
"Essa metodologia possibilitou
que a drosófila pudesse passar de
um excelente modelo para estudos de "genética clássica", em que
os genes eram desvendados pelo
cruzamento de mutantes, para
um modelo aplicado na era da
biologia molecular, em que os
cientistas alteram os genes de um
organismo e verificam o resultado
dessa alteração", diz Loreto.
Hoje em dia, empresas até comercializam moscas alteradas geneticamente feitas sob encomenda, ao custo de cerca de 300 dólares. E os equipamentos usados
para fazer isso são caros.
O micromanipulador usado para fazer as transformações custa
cerca de US$ 10 mil. E o sistema de
microscópio que permite verificar quais moscas foram realmente alteradas no processo (usando
normalmente genes que a tornam
fluorescente sob certas condições
de luz), outros US$ 10 mil.
Em vez de desembolsar esses recursos, o trio resolveu improvisar.
Começou aproveitando pedaços
de microscópios velhos. "Temos
muitos microscópios de aula prática e, com o tempo, sai mais caro
fazer a manutenção deles do que
comprar um novo. Aí é só pegar o
sistema de movimentação da lâmina e adaptar em um suporte.
Nele se põe uma agulha, colada a
uma ponta de micropipeta com
"adesivo instantâneo". Ligando
isso a uma seringa e um tubo plástico, os cientistas já têm o micromanipulador improvisado.
Para o estereomicroscópio, o
grupo está inovando na fonte de
luz que permite a visualização da
fluorescência, usando pequenos e
baratos LEDs (sistemas corriqueiramente encontrados nos sinais
de "stand by" em televisores).
A criatividade inventiva foi
pressionada pela necessidade, segundo Loreto. "Ela veio exatamente da inexistência dos equipamentos empregados para fazer
esses experimentos", diz.
Apesar dos improvisos, a técnica funciona num bom nível. De
todas as moscas desenvolvidas
nos experimentos, 12,5% apresentam as modificações genéticas
desejadas. Pode parecer uma taxa
baixa, mas as transformações feitas com outros métodos e equipamentos não estão muito longe
disso, variando de 5% a 30%.
"Conseguimos no primeiro estudo taxas intermediárias, e os ensaios mais recentes têm confirmado essa variação."
Loreto já recebeu contatos de
cientistas interessados na França
e nos Estados Unidos, mas sua
preocupação principal não é com
eles, mas com os cientistas que
trabalham em lugares com menos
recursos. "O nosso laboratório só
se equipou de forma marcante recentemente, quando entramos
num projeto genoma", diz. "Até
então vínhamos improvisando
muita coisa. Ser meio "professor
Pardal" tem de fazer parte do perfil do pesquisador brasileiro, principalmente se estiver fora dos
principais centros de excelência."
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