São Paulo, Quinta-feira, 20 de Janeiro de 2000


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CIÊNCIA
Técnica pode restaurar a medula espinhal

MARCELO FERRONI
Editor-assistente de Ciência

Cientistas britânicos podem ter descoberto uma forma de recuperar o tato de pacientes que perderam essa função devido a danos à medula espinhal.
O estudo, publicado hoje na revista "Nature", corrigiu, em ratos, um tipo específico de lesão à medula, em que é rompida a conexão entre nervos periféricos do corpo humano e o sistema nervoso central (medula espinhal e cérebro).
"Descobrimos uma forma de reconectar essas fibras nervosas à medula espinhal de ratos e poderemos, no futuro, usar a mesma terapia para danos em humanos", disse, em entrevista por e-mail à Folha, Matt Ramer, da Escola de Medicina de Guy, King e St. Thomas, em Londres.
"A aplicação clínica do método deverá ocorrer em questão de anos, não de décadas", afirmou.
No entanto, novos estudos precisam comprovar a eficiência da técnica, avaliou Luís Augusto Rogano, da clínica de lesão medular da AACD (Associação de Apoio à Criança Defeituosa)."Em laboratório há bons resultados, mas o mesmo não acontece quando o método é aplicado a humanos."
A lesão tratada por Ramer e sua equipe costuma ocorrer, em humanos, devido a acidentes em alta velocidade, como no caso da queda de uma motocicleta.
"Quando uma pessoa cai com a moto, é comum que seu corpo vá para um lado e o braço, para outro", disse Rogano. "Nesses casos, há uma lesão da zona de entrada da raiz dorsal na medula."
Ou seja, a ligação entre os nervos do corpo, mais especificamente de um dos braços, perde o contato com o sistema nervoso central. Acidentes desse tipo são chamados de avulsão.
Rogano estima que esses casos de lesão correspondem a cerca de 10% dos acidentes na medula espinhal. Nos EUA, há anualmente cerca de 10 mil a 12 mil acidentes que prejudicam a medula.

Ligação restaurada
O estudo usou cerca de cem ratos. Primeiro, eles tinham a sua ligação nervosa cortada cirurgicamente, o que fazia com que perdessem, em uma das patas, o tato.
Em seguida, os cientistas injetaram grandes doses de substâncias chamadas fatores neurotróficos. Esses fatores de crescimento, presentes em pequenas quantidades no organismo, mantêm "saudáveis" os neurônios do corpo.
Após duas semanas, o tato dos ratos foi testado, com pressão das patas e uso de água quente. Os animais reagiram aos estímulos. "O fato de os ratos terem recuperado alguma sensação já é muito encorajador", disse Ramer.
O método, no entanto, precisou ser aplicado logo depois do dano. "Se o paciente for tratado depois de um ano, já há uma reação cicatricial dos nervos. Às vezes, eles também atrofiam", disse Rogano.
Os fatores neurotróficos atuaram como um estímulo adicional ao ligamento dos feixes nervosos e "pularam" uma barreira natural da medula espinhal, que contém substâncias que bloqueiam essa nova aproximação dos nervos.
Segundo Ronaldo Azze, ortopedista do Hospital da Clínicas, pesquisas semelhantes são realizadas em vários países, inclusive no Brasil. "No momento, não temos nada muito positivo."
Segundo Ramer, "a importância do estudo é que agora há esperanças de restaurar as fibras nervosas, permitindo aos pacientes recuperar o tato e aliviando a dor associada a esse tipo de dano".


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