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Canto de pássaro "abre trilha" na mata atlântica
Pula-pula tem sistema de comunicação decifrado
Maria-Luisa da Silva
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O pequeno pula-pula-assobiador, que tem em média 10 cm de altura e pesa apenas 25 gramas |
EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL
Ser sofisticado e simples ao
mesmo tempo, por mais paradoxal que possa parecer, é a
principal qualidade do sistema
de comunicação do pequeno
pula-pula-assobiador, pássaro
que habita a mata atlântica e
ainda existe até em São Paulo.
"É um único tipo de canto,
que serve tanto para fazer o reconhecimento específico com
todos, quanto para estabelecer
a comunicação com os vizinhos", explica Danilo Boscolo,
um dos pesquisadores do grupo
que decifrou o sistema de comunicação sonora da ave.
É a primeira vez que um estudo deste tipo, realizado na reserva do Morro Grande, em Cotia (SP), é feito para um pássaro
das zonas tropicais, segundo
Jacques Vielliard, pesquisador
da Unicamp e outro autor do
estudo. O trabalho está publicado na revista "PLoS One".
Os experimentos realizados
revelaram a complexidade do
canto do pula-pula-assobiador.
A pequena ave, que tem em média 10 cm e pesa 25 gramas, tem
um só tipo de canto. Mas com
ele a espécie consegue emitir e
obter todas as informações de
que precisa, ao mesmo tempo.
"O som, digamos, tem um componente público e outro privado", explica Boscolo.
O canto emitido pelos machos tem um componente mais
agudo, que atravessa uma distância de pelo menos 100 metros da mata atlântica. O segundo componente, mais grave,
não tem poder tão alto de cortar a floresta atlântica. "O som
que se propaga mais serve para
a ave promover o reconhecimento dos outros representantes da mesma espécie. É como
você passar por uma rua, por
exemplo, e perceber o som de
outros seres humanos dentro
de algum lugar", diz Boscolo.
A segunda parte é apenas para os vizinhos mais próximos.
"O som que chamamos de privado atinge uma distância menor. Serve para o animal se comunicar com seus vizinhos na
mata, que são normalmente de
três a quatro. Se houver um invasor de território da mesma
espécie ele logo será flagrado."
Segundo Vielliard, o sistema
de comunicação decifrado agora pelo grupo de que ele faz parte é uma prova cabal da evolução: "Não era esperado que esse
bicho tivesse um sistema simples e sofisticado como esse.
São variações sutis que ele usa".
Segundo ele, a seleção natural trabalhou para afinar o canto do pula-pula-assobiador,
que é totalmente adaptado às
condições da mata atlântica
-ambiente onde é bastante
complicado um som se propagar com facilidade devido aos
grandes obstáculos naturais.
"É uma ave pequena, rápida,
que vive no meio da mata atlântica. Se ela não tivesse um sistema de comunicação sonora eficiente seria muito difícil ela se
reproduzir, se proteger e cuidar
dos filhotes", explica Boscolo.
Uma pequena alteração no
mesmo tipo de canto estudado
pelo grupo, segundo Vielliard,
também foi identificada: "Isso
serve para ter uma noção de
distância". O fato de o sistema
de comunicação do pula-pula-assobiador ter sido forjado durante milhares de anos pela seleção natural em sintonia com
o ambiente onde vive a espécie
torna fundamental a preservação das áreas de mata atlântica.
Estima-se que, do bioma original, sobraram apenas 7%.
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