São Paulo, sábado, 20 de fevereiro de 2010

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Única vacina para HIV com sucesso parcial sofre revés

Grupo descobre que droga, anunciada em 2009, só oferece proteção temporária

Imunização, que reduzia em 31% o risco de contágio, foi a primeira em 20 anos a não ser um fracasso; ela ainda será útil, dizem os cientistas


RICARDO MIOTO
DA REPORTAGEM LOCAL

Cientistas anunciaram ontem mais um obstáculo na luta contra a Aids. A vacina que, em setembro do ano passado, ganhou destaque por conseguir diminuir em 31% o risco de contaminação por HIV em voluntários na Tailândia, na verdade não funciona tão bem. Segundo os próprios pesquisadores que a testaram, a proteção que ela oferece é apenas temporária -cerca de um ano.
O valor de 31% pode não parecer alto. Realmente seria necessário mais do que isso para que fosse viável produzir uma vacina em grande escala. Mas era a primeira vez em que uma vacina tinha algum grau de sucesso, mesmo que parcial. A esperança era que, a partir dela, fosse possível desenvolver uma imunização mais eficaz.
Por isso, na época, os cientistas envolvidos na pesquisa estavam otimistas. Eles pertenciam a órgãos americanos -incluindo o Exército- e tailandeses, além de uma empresa e uma ONG, donas cada uma de metade da vacina.
Anthony Fauci, chefe do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA, um dos financiadores do teste na Tailândia, disse então: "Faz mais de 20 anos que todas as vacinas foram essencialmente fracassos. Parece que estávamos tateando por um corredor escuro, até que uma porta finalmente se abriu".
A porta continua aberta, mas agora parece que será ainda mais difícil atravessá-la.

Ainda útil
Para o coronel Nelson Michael, do Instituto Walter Reed de Pesquisas do Exército dos EUA, que anunciou as novas descobertas na Conferência de Retrovírus e Infecções Oportunistas, em São Francisco (EUA), a vacina ainda é útil. "Ela tem um efeito fraco e modesto, mas é possível construir algo a partir dela."
Para ele, o tempo limitado de proteção da vacina, conhecida como RV 144, não é motivo para jogá-la no lixo. "É o ideal? Não é. Mas existem vacinas, como a da gripe, que você tem de tomar todos os anos."
Esper Kallás, infectologista da USP, concorda. "É algo que acaba criando mais um problema, mas não é um abalo. A situação ainda é melhor do que alguns meses atrás, quando a gente não tinha nada." Para ele, as estratégias de vacinação podem se adaptar a uma vacina que não dure a vida inteira.
"Em diferentes fases da vida, as pessoas tem riscos diferentes de infecção pelo HIV. Uma criança praticamente não tem risco de transmissão sexual, mas no final da adolescência esse risco dá um pulo. Você pode identificar os períodos de vulnerabilidade e adequar as estratégias de vacinação."

Como assim?
Quando anunciaram o sucesso parcial da vacina, os cientistas deixaram claro que não conheciam bem como ela funcionava. Agora, além de não saberem como ela funciona, também não entendem como ela perde eficácia com o tempo.
"Todos querem saber por que ela funcionou e quais testes poderíamos ter feito no laboratório para prever isso", diz Michael. O sangue dos voluntários continuará a ser analisado em busca de pistas que possam levar a explicações sobre como a vacina funciona, diz ele.
Os resultados dessas novas análises levarão cerca de um ano. Enquanto isso, cientistas no mundo inteiro estarão procurando paralelamente maneiras de entender como vacinas podem barrar o HIV.

Com Reuters



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