|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Estímulo elétrico cura mal de Parkinson em roedores
Técnica criada por cientista brasileiro pode ser testada em humanos já em 2010
Método, que consiste em implantar um eletrodo na medula espinhal, será antes aplicado em macacos num experimento em Natal (RN)
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma técnica para tratar os
sintomas do mal de Parkinson
com suaves impulsos elétricos
na medula espinhal teve sucesso num experimento com camundongos e poderá ser testada em humanos já em 2010. O
método, descrito hoje em estudo no periódico "Science", foi
ideia do neurocientista paulista
Miguel Nicolelis, da Universidade Duke, da Carolina do Norte (EUA). É a segunda vez na
história que o trabalho de um
brasileiro é destaque de capa da
publicação centenária.
A técnica, idealizada por Nicolelis e desenvolvida pelo chileno Romulo Fuentes, consiste
em conectar um pequeno eletrodo -uma lâmina de metal-
na coluna dos animais e ligá-lo
a uma bateria que dispara impulsos elétricos com uma frequência controlada. Nos roedores, a estratégia conseguiu reverter os sintomas de Parkinson, doença degenerativa que
afeta a habilidade motora das
pessoas e causa tremores.
Como a aplicação de eletrodos na medula já se provou segura para tratamento de dor
crônica em humanos, o uso da
técnica contra Parkinson pode
sair da fase experimental para a
clínica mais rápido. E, a partir
de agora, as pesquisas provavelmente serão feitas no Brasil.
A primeira instituição a dar
continuidade à técnica será o
Instituto Internacional de
Neurociências de Natal, que
Nicolelis ajudou a fundar e acaba de contratar Fuentes.
"Nossa perspectiva é fazer o
teste em quatro a seis macacos
neste ano e, se os resultados forem iguais aos de camundongos, já partir para os primeiros
estudos clínicos [em humanos]", disse Nicolelis à Folha.
"O equipamento que será usado futuramente é totalmente
implantável. Esses estimuladores têm sido usados há anos na
tentativa de tratar dores crônicas, e a tecnologia já está desenvolvida. É só questão de
usar a frequência correta, a
corrente correta e o padrão de
estimulação para Parkinson."
A nova técnica tem o potencial de substituir a chamada estimulação cerebral profunda,
procedimento que hoje costuma ser o último recurso para
pacientes em estágio avançado
da doença. A técnica é um procedimento muito invasivo.
"Você tem de entrar dez centímetros no cérebro e existe 5%
de risco de sangramento que
pode ser fatal", explica Nicolelis. "Além disso, só 25% a 30%
dos pacientes que estão em estado avançado conseguem suportar essa cirurgia". O novo
mecanismo é de aplicação mais
simples do que um marca-passo cardíaco, diz o cientista.
Conexão epilepsia
Segundo o cientista brasileiro, a ideia de usar essa técnica
veio de estudos que ele mesmo
realizara sobre epilepsia.
"Há dois anos, nós começamos a registrar a atividade do
cérebro de animais parkinsonianos, e eu percebi que ela era
virtualmente idêntica a das crises epilépticas que nós tínhamos estudado dez anos atrás",
conta. Encontrando um ponto
correto para aplicar os impulsos elétricos na coluna dos animais, o grupo de pesquisadores
conseguiu amenizar os sintomas da doença, assim como havia feito com a epilepsia.
Os pesquisadores explicam
que, apesar de as duas doenças
não terem uma origem comum,
parte dos circuitos nervosos
que elas afetam é o mesmo, por
isso há uma afinidade entre os
mecanismos delas. Nicolelis
explica que por trás do mal de
Parkinson há um fenômeno em
que os neurônios do sistema
motor entram todos em sincronia, disparando ao mesmo tempo. "Todos os músculos tentam
se contrair ao mesmo tempo, e
o resultado final disso é que você não consegue fazer nada."
Dose reduzida
Outra vantagem do novo tratamento, diz Nicolelis, é que ele
permite prolongar a eficácia da
L-dopa, a droga usada para barrar os sintomas da doença nos
estágios iniciais. O grande problema da L-dopa é que ela perde a eficácia à medida que o paciente a ingere. Mas, quando foi
usada em conjunto com a estimulação elétrica da medula,
melhorou ainda mais o estado
dos roedores, mesmo com a dose da droga reduzida em 80%.
O que a L-dopa faz é recuperar o nível cerebral de dopamina, molécula transmissora de
impulsos nervosos que nos parkinsonianos é escassa, diz Nicolelis, entusiasmado com a
aceitação da pesquisa. "A capa
da "Science" é o pináculo de
qualquer publicação que um
cientista pode ter."
Texto Anterior: Pesquisa reconstrói fera do mar primordial Próximo Texto: Frase Índice
|