São Paulo, sexta-feira, 20 de outubro de 2000

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AIDS
Formulação desenvolvida nos EUA combate vírus depois da infecção; ainda não há previsão de testes em seres humanos
Vacina de DNA controla HIV em macacos

ISABEL GERHARDT
DA REPORTAGEM LOCAL

Pesquisa feita com macacos nos Estados Unidos revela que, com relação à Aids, uma vacina de DNA pode não ter papel preventivo, mas poderá se tornar um importante auxiliar no tratamento e no controle da epidemia. No estudo da Escola Médica de Harvard (EUA), os macacos que receberam a vacina permaneceram saudáveis depois de serem inoculados com o vírus HIV.
Não há previsão de quando essa vacina será testada em humanos. O trabalho sai hoje na revista "Science" (www.sciencemag.org).
"Embora a vacina não previna a infecção (pois existe um crescimento do número de partículas virais após a contaminação), ela controla a replicação do vírus e evita a imunodeficiência, a progressão da doença e a morte", disse à Folha Dan Barouch, o principal autor da pesquisa.
Os animais vacinados apresentaram níveis indetectáveis ou muito baixos do vírus, quando expostos a ele. Em compensação, metade dos animais que receberam uma vacina placebo (inócua, ou seja, sem o DNA) morreu após 140 dias da infecção com o vírus. A outra metade encontrava-se doente, com um número elevado de partículas virais.
A estratégia utilizada pelos cientistas envolveu, na verdade, três vacinas de DNA. Uma delas continha o gene que codifica uma proteína da capa do HIV. A outra, o gene de uma outra proteína da capa do SIV ("primo" do HIV, mas que só ataca macacos). E a última delas, o gene de uma proteína que estimula a produção de células de defesa do organismo.
Tantas vacinas têm várias razões de ser. Uma delas é que os cientistas, após vacinarem os animais, tinham de desafiá-los com um vírus quimérico, ou seja, um composto de HIV e SIV. A mistura se justifica porque o HIV não provoca a doença em macacos. Quem causa a moléstia é o SIV.

Modelo para o homem
Com esse expediente de incluir elementos de ambos os vírus na vacina, os cientistas tiveram por objetivo provocar a doença e, ao mesmo tempo, obter um modelo o mais semelhante possível ao do ser humano (ou seja, uma infecção pelo HIV).
A adição da terceira vacina, com o gene da interleucina-2, é "uma engenhoca muito bem-feita", segundo o médico Esper Kallás, do Laboratório de Imunologia do Departamento de Medicina da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Ao ser incorporado pela célula, o gene da interleucina-2 ordena a produção da substância. Isso faz com que proliferem os linfócitos T (tipo de célula responsável pela destruição de células infectadas com o vírus) que estejam perto da célula transformada. "Com isso, aumenta o número de células capazes de reconhecer aquelas que contêm o vírus, aumentando a capacidade de resposta do organismo", explica Kallás.
"O efeito que eles tiveram nesse estudo é brilhante. Esse é um dos estudos que teve melhor imunogenicidade e proteção contra a infecção", diz o brasileiro.
Segundo Robert Siliciano, pesquisador da Universidade Johns Hopkins (EUA) que comenta o trabalho de Barouch na "Science", uma vacina desse tipo, se no futuro for utilizada em seres humanos, poderá controlar tão bem a contagem de partículas do HIV quanto o uso de antivirais -"com a vantagem de não apresentar os efeitos colaterais dessas drogas e ser muito mais barata", afirma Siliciano.
"Nos países de Terceiro Mundo, onde não existem condições de tratamento para toda a população, a vacina será um fator de controle da expansão da epidemia."
Em 1999, cerca de 5,4 milhões de pessoas foram infectadas com o HIV e 2,8 milhões morreram de Aids, segundo a OMS.



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