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MEDICINA
Descoberta de alemães e americanos explica por que drogas promissoras não podem conter espalhamento de câncer
Célula de tumor muda forma para migrar
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Cientistas alemães e americanos
descobriram como as células do
câncer conseguem migrar para os
vários órgãos do corpo, escapando a drogas que deveriam contê-las. Elas são capazes de mudar de
forma, esgueirando-se pelas fibras que separam os tecidos.
O achado, publicado na edição
deste mês da revista científica
"The Journal of Cell Biology"
(www.jcb.org), explica por que
algumas drogas promissoras contra a metástase (nome dado ao espalhamento do câncer por órgãos
diferentes do corpo) não funcionaram. É que esses remédios só
impediam uma estratégia de migração do tumor -a que envolve
quebrar as fibras dos tecidos.
O novo trabalho mostra que as
células migrantes adotam uma segunda maneira de viajar: ao mudar de forma, elas ficam tão maleáveis que conseguem deslizar
pelos poros já existentes nas fibras. O único jeito de impedir a
metástase, portanto, seria barrar
as duas artimanhas.
Coordenada por Peter Friedl, da
Universidade de Würzburg, na
Alemanha, a pesquisa pretendia
esclarecer por que as drogas usadas para impedir que as células
tumorais abrissem caminho pelo
corpo haviam falhado.
Sabia-se que essas migrantes
malignas costumam lançar para
fora substâncias que abrem buracos na chamada matriz extracelular -massa de proteínas que circunda os diferentes órgãos. Usando proteases -moléculas que
despedaçam proteínas-, elas
conseguem abrir caminho.
Metamorfose flagrada
Friedl e seus colegas queriam
ver o que acontecia quando as
proteases usadas pelas células tumorais perdiam o efeito, já que
era isso o que faziam as fracassadas drogas antimetástase. "Havia
alguns relatos de que essas drogas
tinham falhado, mas ninguém tinha explicado exatamente como", contou Friedl à Folha.
No tubo de ensaio e em camundongos, o grupo observou dois tipos de tumor, que receberam
substâncias capazes de inibir a
ação das proteases. A equipe podia ver o que acontecia ao longo
do tempo usando câmeras de vídeo e um microscópio que tirava
fotos periodicamente.
O que os pesquisadores flagraram foi uma metamorfose completa. Sem poder contar com as
proteases, as células de tumor
mudaram de forma para poder
atravessar as brechas nas fibras de
proteína. Passaram a se parecer
com um tipo de ameba (um organismo de uma célula só) que vive
no solo -quase como se tivessem
regredido na evolução.
A semelhança não era só física: a
nova forma permitia que as células tumorais se mexessem como a
ameba, comprimindo a massa celular como uma linguiça para poder atravessar as brechas na matriz, sem danificar a fibra, e expandindo-se de novo depois de
ter passado.
"É como se eu estivesse numa
selva e de repente perdesse o meu
facão", compara Friedl. "Eu simplesmente começo a deslizar do
lado das folhas, sem cortá-las, e
continuo meu caminho", diz o
pesquisador alemão, para quem o
trabalho mostra que as células
cancerosas são muito mais adaptáveis e "inteligentes" do que se
costuma imaginar.
Para Friedl, a estratégia combinada que poderia barrar o processo ainda precisa ser encontrada.
"Nós sugeriríamos o uso de inibidores que bloqueassem várias
proteases, mas além disso é preciso descobrir como o movimento
amebóide pode ser inibido", diz.
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