São Paulo, terça-feira, 21 de março de 2000


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NEUROLOGIA
Estudo na Suiça conclui que a faculdade mais afetada é a de lembrar informações antigas
Hormônio do estresse prejudica memória


ISABEL GERHARDT
da Reportagem Local

A frase repetida tantas vezes por alunos após sair de uma prova -"Não sei o que aconteceu, na hora H me deu um branco"- pode soar como desculpa para muitos educadores. No entanto, segundo estudo publicado no número de abril da revista "Nature Neuroscience", o estresse realmente pode fazer com que a memória seja prejudicada.
Segundo esse estudo, o culpado é o cortisol, hormônio secretado pelas glândulas supra-renais, em resposta a situações de estresse.
Cientistas identificaram três diferentes fases da memória: aquisição, consolidação e recuperação.
A aquisição é o passo inicial para formação de uma nova memória. A consolidação é necessária para a memória de longo prazo. Quando essa etapa falha, a memória está disponível apenas imediatamente após o aprendizado (como quando se estuda para uma prova no último minuto). A recuperação é o processo que dá acesso à memória consolidada.
Os autores da pesquisa pediram a um grupo de 36 pessoas que memorizassem uma lista de 60 palavras que eram apresentadas na tela de um computador, quatro segundos cada palavra.
Os participantes, então, eram submetidos a dois tipos de testes, em dois tempos, imediatamente após a visualização da lista e um dia depois. Um deles pedia que as pessoas escrevessem todas as palavras da lista que elas conseguissem se lembrar. Esse teste serviu para testar a capacidade de recordar, de evocar a memória, ou seja, testou a memória de longo prazo.
O outro teste pediu que as pessoas identificassem, entre 120 palavras, quais as que estavam presentes na lista anterior. O objetivo desse outro teste foi estudar a chamada memória de reconhecimento (veja quadro ao lado).
Os autores da pesquisa forneceram tabletes contendo 25 mg de cortisona em diferentes períodos do experimento: a) uma hora antes da memorização da lista de palavras, b) uma hora depois da memorização da lista e c) vinte e quatro horas após a memorização da lista, uma hora antes de fazer o teste de evocação da memória. Após ser ingerida, a cortisona é transformada, no corpo, em cortisol.
O objetivo de administrar a cortisona uma hora antes e imediatamente após a apresentação da lista foi verificar se o corticóide pode influenciar os processos de aquisição e consolidação da memória.
O que eles observaram foi que a cortisona não afetou a capacidade de aquisição, evocação e reconhecimento, nos testes feitos logo após a memorização da lista.
Segundo Dominique Quervain, um dos autores do estudo, o cortisol não provocou nenhum tipo de sintoma logo após ser ingerido. Porém, ele prejudicou a memória de uma a quatro horas após ter sido ingerido.
Quando administrado antes do teste feito 24 horas após a memorização das palavras, o cortisol não afetou a capacidade de reconhecimento, mas prejudicou a capacidade de evocação.
Os voluntários que ingeriram cortisona conseguiram se recordar de um número significativamente menor de palavras do que aqueles que, ao invés de tabletes de cortisona, receberam placebo (substância que não causa nenhum efeito no organismo). Tiveram a chamada memória de longo prazo prejudicada.
A quantidade de cortisona nos tabletes foi calculada para resultar em níveis de cortisol equivalentes aos níveis apresentados naturalmente no sangue de quem sofre uma situação de estresse agudo.
Os autores concluíram que o cortisol afeta a capacidade de acessar a memória de longo prazo, sem afetar outras funções intelectuais ou de associação.
Quervain comparou os resultados com o que acontece quando alguém faz uma prova e por estar muito nervoso tem problemas de recordar o que aprendeu. Quando a pessoa relaxa, os níveis hormonais voltam ao normal, e ela, de repente, se lembra do que, no exame, não foi capaz de recordar.


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