São Paulo, quinta-feira, 21 de agosto de 2008

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Vítimas da gripe de 1918 ainda são imunes ao vírus

Descoberta pode ajudar na produção de anticorpos contra eventual pandemia

Anticorpos tirados do sangue de pessoas expostas à gripe espanhola foram capazes de combater o parasita em camundongos


EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL

O fôlego do sistema de defesa humano contra o vírus da gripe dura, pelo menos, 90 anos. A constatação vem de um estudo realizado nos Estados Unidos.
Em artigo no site da revista científica "Nature", os cientistas demonstram como foi possível frear, em camundongos, uma infecção causada pelo vírus da gripe espanhola de 1918.
Os microrganismos injetados nos animais foram reconstruídos geneticamente.
Para construir a barreira imunológica nos roedores, o grupo, liderado por James Crowne, da Universidade Vanderbilt, usou anticorpos retirados de 32 pessoas que viveram naquela época. Todos os participantes da pesquisa, que tinham entre 91 e 100 anos de idade quando o estudo foi feito, relataram que perderam parentes na pandemia.
"Esse estudo é seguramente um dos poucos que puderam demonstrar a manutenção da nossa resposta imunológica após tanto tempo", disse à Folha o infectologista Esper Kallás, pesquisador da Unifesp.
Os americanos isolaram os linfócitos B do sangue dos idosos. São essas células que produzem os anticorpos.
Quando o vírus da gripe de 1918 entrou nos roedores, ele logo foi detectado e imobilizado. O que, para os autores da pesquisa, mostra que a resposta imunológica contra aquele invasor ainda estava ativa.
"O risco de termos uma nova epidemia como aquela é pequeno. Temos a capacidade de produzir vacinas eficazes contra o H1N1 [o vírus de 1918]", diz Kallás. Segundo o infectologista brasileiro, essa linhagem consta das vacinas que são aplicadas no Brasil todos os anos.
A gripe espanhola, que está completando 90 anos agora, segundo o livro "Influenza, a Medicina Enferma", da historiadora Liane Bertucci, também causou um pandemônio na cidade de São Paulo.
Aproximadamente um terço dos 528.295 habitantes da capital paulista foram infectados. Destes, 5.000 morreram. O número de coveiros teve de ser quadruplicado na cidade.
Mas, se o risco de uma nova pandemia de gripe espanhola é pequeno, o mesmo não pode ser dito em relação ao vírus H5N1, outro tipo de influenza, a gripe aviária. E aqui o novo estudo pode ajudar a medicina.
"Nós sabemos, pelos nossos estudos de biologia molecular, que o vírus de 1918 era um vírus aviário", disse Crowe.
Portanto, segundo o pesquisador, as lições aprendidas agora poderão ser úteis no futuro. "É possível ter uma noção maior do que esperar, em termos de respostas imunológicas, no caso de surgir uma outra epidemia de um vírus aviário."
Sem uma memória imunológica contra o novo inimigo, o sistema humano pode demorar pelo menos alguns meses para conhecer o novo invasor.
O cenário hoje seria mais dramático, porque as pessoas costumam viajar mais pelo mundo, o que poderia dar grande velocidade à epidemia.
Porém, segundo Crowe, já é possível imaginar a construção de anticorpos potentes contra o novo vírus a partir dos resultados obtidos por sua equipe.


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