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BIOTECNOLOGIA
Uso de vírus para enxertar DNA multiplica por 6 taxa de alteração genética; idéia é obter órgãos para transplante
Porcos transgênicos ganham eficiência
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Um grupo de 32 leitões que emitem um brilho verde quando estão no escuro pode inaugurar
uma nova geração de animais
transgênicos, seis vezes mais eficientes e com um décimo do custo. Segundo os cientistas alemães
que os criaram, é um passo para
que esses bichos passem de fato a
beneficiar a saúde humana.
O truque que permitiu isso foi o
uso de um vírus para transferir o
gene estranho (no caso, o que dá
aos bichos sua estranha fluorescência verde), ao invés de injetá-lo
diretamente no embrião suíno.
"A eficiência na produção de
embriões transgênicos aumentou
30 vezes, e o nascimento de animais com a característica desejada, seis vezes", disse por telefone
Pfeifer, 38, médico da Universidade Ludwig-Maximilian em Munique (sul da Alemanha).
Pfeifer diz que a técnica deve fazer com que o preço de criar grandes mamíferos transgênicos, como porcos e vacas, passe a ser um
décimo do que é hoje, de acordo
com cálculos preliminares feitos
pela equipe de pesquisa.
A peso de ouro
"Isso é muito importante porque hoje, na Alemanha, você não
consegue criar um porco transgênico por menos de US$ 50 mil ou
US$ 30 mil, e uma vaca por dez
vezes esse valor", afirma o médico. "O principal fator que gera esse encarecimento é exatamente a
ineficiência do processo, que nosso trabalho ajuda a contornar."
Pfeifer explica que a técnica
mais usada hoje para criar animais transgênicos, a da microinjeção, consegue produzir animais
com o DNA estranho incorporado ao seu com uma eficiência
muito baixa (entre 1% e 10% dos
embriões injetados).
Até aí, aliás, não há nada de estranho: "No jeito clássico de fazer
a coisa, o processo é mecânico.
Você precisa enfiar um [tubo] capilar de vidro no núcleo do embrião e então injetar o DNA, atrapalhando todo o processo normal
de desenvolvimento dele. É muito
violento", afirma o alemão.
Seria muito mais razoável utilizar um vírus, argumenta o pesquisador, que faz o mesmo trabalho (integrar o gene desejado ao
núcleo do embrião) de forma
bem mais eficaz. Com essa idéia
na cabeça, a equipe usou um lentivírus como cavalo-de-tróia, infectando os embriões suínos logo
depois da fecundação, quando
eles ainda tinham uma só célula.
O gene estranho carregado pelo
invasor viral continha as especificações para a produção da GFP
(proteína fluorescente verde, na
sigla em inglês), uma molécula retirada de alguns tipos de água-viva que causa o característico brilho no escuro. Uma batelada de
animais transgênicos já foi feita
antes usando esse gene, por motivos óbvios: é um jeito fácil de
"marcar" os bichos, de forma que
só os transgênicos sejam identificados pela cor fluorescente.
Suínos brilhantes
A técnica resultou no nascimento de 46 leitões, dos quais 32 carregavam o gene da GFP -70% de
aproveitamento. A proteína estava ativa não apenas na pele dos bichos, mas em diversos órgãos internos. Pfeifer e seus colegas decidiram repetir o teste, acoplando
então ao vírus um promotor
(uma sequência de DNA que regula o funcionamento de outras)
específico para células da pele.
Novamente, o experimento deu
certo: os porquinhos exibiam o
brilho verde na pele e no focinho,
mas não no resto do organismo. A
equipe repetiu o experimento em
embriões bovinos, dos quais 45%
incorporaram o gene da GFP ao
seu DNA. Nesse caso, os embriões
não chegaram a ser implantados
numa mãe de aluguel.
O sucesso bem maior do que o
obtido com outras técnicas deixa
Pfeifer esperançoso quanto à possibilidade de aplicar a técnica à
criação de animais cujos órgãos
poderiam ser transplantados para
seres humanos, ou mesmo com
carne e leite mais nutritivos.
Outra aplicação importante do
feito seria o desenvolvimento de
bichos cujo organismo simulasse
doenças humanas, numa escala
física parecida com a de seres humanos, explica o pesquisador alemão. "Porcos diabéticos seriam
muito mais relevantes que camundongos, por exemplo", explica Pfeifer. "Uma das consequências mais sérias da diabetes é o
aparecimento de cegueira em
pessoas de meia-idade. Mas os camundongos diabéticos não têm
nada nos olhos", afirma.
Apesar dos potenciais problemas no uso de vírus para transferir genes (a inserção num local indesejável poderia causar câncer,
por exemplo), Pfeifer diz que seus
leitões não sofrem efeitos colaterais. "São saudáveis e comem um
bocado, como os porcos costumam fazer", brinca.
O trabalho dos alemães está na
revista científica "Embo Reports"
(www.nature.com/embor), da
Organização Européia de Biologia Molecular.
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