São Paulo, terça-feira, 21 de novembro de 2006

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Parque do Rio tem "safáris" clandestinos

Caçadores montam ranchos e alugam casas dentro de reserva florestal para abastecer tráfico de animais e restaurantes

Parque Estadual dos Três Picos tem apenas cinco fiscais, todos emprestados, para vigiar área de 46,3 mil hectares de mata atlântica

Luciana Whitaker/Folha Imagem
Alfredo Pinheiro, coordenador de pesquisa do parque, mostra apetrechos de caça apreendidos


MARIO HUGO MONKEN
ENVIADO ESPECIAL A CACHOEIRAS DE MACACU

Maior reserva florestal do Estado do Rio de Janeiro, com 46.350 hectares, o parque dos Três Picos é palco de "safáris" promovidos por caçadores que estão matando animais como pumas, pacas, sagüis, jaguatiricas, capivaras e muriquis, segundo investigações do Ministério Público Estadual e relatos dos funcionários da reserva.
Para tentar coibir a ação dos caçadores, o parque conta apenas com cinco fiscais. Só dois possuem porte de arma. Apesar de a unidade ter sido criada em 2002, o órgão responsável, o IEF (Instituto Estadual de Florestas), do governo estadual, não realizou concurso público. Os fiscais foram cedidos por outras autarquias.
O parque Três Picos abrange cinco municípios da região serrana e das baixadas litorâneas (Teresópolis, Nova Friburgo, Cachoeiras de Macacu, Guapimirim e Silva Jardim) e foi criado para formar um cinturão de mata atlântica juntamente com outras unidades de conservação. Sua fundação representou um acréscimo de 75% em área protegida no Estado.
Segundo informações de funcionários, os caçadores, em grupos de até 30 pessoas, passam dias no interior da mata. Montam ranchos com camas, colchonetes e até fogão.
A caça na região, que antes era de subsistência, hoje tem fins lucrativos- tráfico ou venda da carne para restaurantes. Relatos indicam que os caçadores montam armadilhas para os animais com fios de náilon amarrados nas árvores, que acionam armas.
Neste ano, os fiscais já apreenderam 42 armas e 300 cartuchos de munição e desarmaram pelo menos cinco ranchos. Os fiscais admitem ser difícil identificar os caçadores porque a maioria vem de fora e atua nas áreas menos visitadas.
Correm perigo 16 de 48 espécies de mamífero da região e aves como arapongas, águias-cinzentas e gaviões-pega-macaco. Algumas aves, como a jacutinga e o macuco, já estão quase extintas da reserva.

Agenciadores
Os caçadores se utilizam de outras estratégias. Há aqueles que contratam guias para ajudá-los a percorrer o parque. Há casos em que eles soltam cachorros na floresta. Os fiscais dizem também que há agenciadores de caça, pessoas que alugam residências dentro do parque e em seu entorno para que caçadores possam se hospedar.
Em pequeno número, os fiscais ficam sujeitos a retaliações. No mês passado, após um rancho ter sido desmontado na mata, caçadores efetuaram pelo menos cinco disparos em direção à sede do parque, em Cachoeiras de Macacu.
As armadilhas para caça já causaram uma tragédia. Em julho, o pedreiro Clair Nunes Filho, que iria acampar no local, morreu com um tiro ao tentar destruir uma tocaia montada por caçadores na reserva.
A caça não é o único problema no parque Três Picos. A extração de vegetais, como palmito, bromélias e orquídeas, é constante. Só em abril, por exemplo, foi apreendida em Teresópolis uma tonelada de palmito furtado do parque.
Segundo relatos de funcionários, cada palmiteiro tem condição de retirar do parque, a cada três dias, pelo menos 70 kg do produto. Suspeita-se que 250 palmiteiros atuem na área.
A questão fundiária não foi resolvida. Quando o parque foi criado, várias famílias já moravam por lá e até agora apenas cerca de 10% do problema foi solucionado. As residências trazem risco porque muitos moradores criam gado e realizam queimadas para pastagem. Só neste ano, seis hectares de florestas foram destruídos.
Segundo Flávio de Jesus, administrador do parque, Três Picos é custeado por um acordo de compensação ambiental entre o governo estadual e a empresa TermoRio, que construiu uma termelétrica na Baixada Fluminense. Pelo acordo, serão repassados R$ 6 milhões para a reserva, mas, até agora, pouco mais de R$ 1 milhão foi gasto.


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