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São Paulo, terça-feira, 22 de julho de 2003

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ENGENHARIA

Organizadas trouxeram um comportamento imprevisto que afeta estruturas antigas, afirma estudo da USP

Vibração da torcida prejudica os estádios

MARCUS VINICIUS MARINHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma cena comum em um domingo de futebol é a vibração da torcida, que, em determinados momentos, chega a fazer balançar o estádio. Isso acontece, segundo um estudo da Universidade de São Paulo, porque a grande maioria dos estádios brasileiros não foi projetada para o comportamento dinâmico das torcidas.
As torcidas organizadas, surgidas no fim da década de 60, trouxeram um outro tipo de comportamento ao estádio: elas comandam o pulo sincronizado dos torcedores, fazendo com que muita pressão ao mesmo tempo seja exercida sobre as estruturas dos estádios.
"Não cabe criticar o projeto dessas estruturas, que estavam preparadas para a situação que se tinha na mão na época da construção. Mas o fato é que, como as pessoas agora pulam de forma sincronizada, um novo problema é gerado. Esse fator humano danifica a estrutura de estádios que não estão preparados", disse à Folha o engenheiro José Fernando Sousa Rodrigues, 30, autor do estudo, sua tese de doutorado.
"Não posso dizer que não pode acontecer um colapso dos estádios, mas essa é uma hipótese extrema. De qualquer maneira, a verificação desse novo efeito tem de ser feita, até por um fator que a gente chama de conforto humano: o torcedor que vai assistir ao jogo se sente incomodado com aquela vibração", afirma Rodrigues. "Os estádios têm de ser readequados para a situação pela qual eles estão passando hoje."
Rodrigues propõe, em seu estudo, um método de verificação do "conforto humano", baseado na vibração da estrutura que o usuário sente nos picos de agitação das torcidas.

Sincronia
A equipe do Laboratório de Estruturas e Materiais Estruturais da Escola Politécnica da USP, onde Rodrigues desenvolveu sua pesquisa, verificou com sensores adequados as vibrações ocorridas em cem jogos, realizados em quatro estádios diferentes: o Morumbi e o Ibirapuera, em São Paulo, o Maracanã, no Rio de Janeiro, e o Castelão, em Fortaleza.
Depois disso, os pesquisadores desenvolveram modelos matemáticos que explicassem o comportamento das torcidas durante o decorrer dos jogos de futebol. Eles chegaram a uma conclusão: nenhum dos estádios analisados possuía, naquela época, estrutura adequada para a realização de grandes partidas.
Os estudos, que nos quatro estádios contaram com a colaboração das entidades responsáveis, sugeriram mudanças estruturais que iam desde reforço das pilastras até o uso de amortecedores. A equipe do laboratório participou do processo de renovação que ocorreu em cada um dos estádios, o que, no caso do Morumbi, por exemplo, culminou com a instalação de amortecedores, que terminou há dois anos. Nos estádios do Castelão, Maracanã e Ibirapuera, segundo Rodrigues, também foram realizadas mudanças que agora asseguram a segurança e o conforto dos torcedores.
"Cada estádio é um caso. É preciso que se meça a vibração gerada pelo pulo sincronizado da torcida para que se encontre uma solução. E isso não faz parte das especificações da norma brasileira hoje", afirma. "As regras precisam estar sempre adequadas às descobertas da engenharia, e esse não tem sido o caso. A maior parte dos estádios está adequada à realidade da década de 70."

Nova mentalidade
Segundo Rodrigues, alguns estádios construídos recentemente têm adotado uma nova postura, sendo projetados de acordo com a pressão dos torcedores.
"Um exemplo é o estádio Jardim Belval, em Barueri. Um trabalho de projeção de dinâmica da torcida que considera o conforto humano foi realizado antes mesmo da construção do estádio", afirma. "O comportamento padrão do brasileiro no estádio, que é parecido em todos os lugares do Brasil do ponto de vista mecânico, pode servir para prever o efeito de conforto humano."
Para Rodrigues, o atraso da norma brasileira atrapalha a construção de estádios mais seguros e confortáveis. "Como a norma não reconhece esse problema de conforto, fica mais difícil que a construção e verificação de estádios leve isso em consideração", afirma.
"A minha sugestão, em vez de grandes reformas estruturais, são pequenas mudanças, como os amortecedores. Nós conhecemos nossa torcida, quanto ela pula e como. Basta boa vontade."


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