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EUA barram satélite do Brasil com a China
Empresas nacionais que trabalham na construção das naves CBERS-3 e 4 não conseguem mais importar peças americanas
Limitação à exportação de
tecnologia à China causa o
problema, que pode atrasar lançamentos; embaixada
afirma que veto não é novo
Joel Silva/Folha Imagem
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Sede da Opto, em São Carlos, onde câmera do CBERS-3 é montada; empresa pagou US$ 45 mil por peça que não pôde vir dos EUA
CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Os Estados Unidos têm imposto restrições ao programa
de satélites que o Brasil mantém em parceria com a China.
Empresas nacionais que fabricam peças para as naves
CBERS (Satélite Sino-Brasileiro de Recursos Terrestres) 3 e 4
têm tido dificuldade para importar peças dos EUA. E, segundo a Folha apurou, representantes do governo americano disseram a diretores do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que não gostariam que o satélite Amazônia-1, de produção 100% nacional, fosse lançado em 2010 a
bordo de um foguete chinês.
As restrições não são voltadas especificamente contra o
Brasil, mas sim contra sua parceira, potência militar e agora
também espacial. Os americanos temem transferir à China,
através do Brasil, tecnologias
sensíveis, que possam ser usadas em equipamentos militares
como mísseis balísticos, satélites-espiões e bombas atômicas.
Quem acaba sofrendo com
isso é o setor de inovação tecnológica no Brasil. Pelo menos
duas empresas subcontratadas
pelo Inpe para produzir partes
do CBERS-3 e do CBERS-4 -a
Mectron, de São José dos Campos, e a Opto, de São Carlos-
foram impedidas recentemente de comprar equipamentos
norte-americanos.
O caso mais grave foi o da
Opto, que está montando a câmera do CBERS-3. Neste ano,
ela teve de cancelar um contrato de US$ 45 mil com a IR (International Rectifier), uma firma da Califórnia, porque o
componente comprado -um
conversor de corrente altamente sensível- não pôde ser
embarcado para o Brasil, mesmo depois de pago.
"O departamento jurídico
disse ao nosso contato lá que,
se ele exportasse, poderia pegar nove anos de cadeia e multa
de US$ 1 milhão", disse Mario
Stefani, diretor de Pesquisa e
Desenvolvimento da Opto. O
dinheiro foi devolvido, mas o
projeto atrasou em seis meses.
Graham Robertson, gerente
de Relações-Públicas da IR, diz
que não é raro que a empresa
seja proibida de exportar depois que se descobre qual é o
mercado final do produto. "Nós
somos controlados no que diz
respeito à China."
"Bomb letter"
O veto atinge dimensões orwellianas. Stefani teve um software para desenvolvimento de
instrumentos ópticos médicos
(comprado dos EUA) travado
remotamente em pleno uso,
porque ele poderia também ser
aplicado em satélites.
"A empresa viu no nosso site
que nós trabalhamos no
CBERS e seus advogados mandaram bloquear o programa",
afirma. "Aí mandaram uma
"bomb letter" e eu tive de assinar dizendo que aquilo era só
de uso médico."
"Bomb letter" é o apelido dado a termos que empresas americanas fazem compradores de
seus produtos no exterior assinarem, comprometendo-se a
não dar a esses produtos nenhuma destinação que os EUA
não aprovariam, como a fabricação de bombas -daí o nome.
Em agosto último, a Dell
computadores mandou uma
carta dessas a um físico brasileiro que comprara duas máquinas da empresa. O termo
exigia compromisso de que os
computadores não seriam repassados a cidadãos do "eixo do
mal" -como Irã, Coréia do
Norte e Cuba. O cientista denunciou o caso e o Ministério
da Ciência e Tecnologia passou
uma reprimenda na Dell.
Paranóia reforçada
Limitações à transferência
de tecnologia sensível não são
novidade, nem exclusividade
dos EUA. Vários acordos internacionais regulam o comércio
de produtos de uso dual.
No caso americano, o Departamento de Estado faz cumprir
uma regulamentação chamada
Itar (International Traffic in
Arms Regulations), que lista
uma série de componentes de
exportação restrita e classifica
os países em vários graus de
proibição, de acordo com seu
grau de desenvolvimento tecnológico e suas relações com os
EUA. Os objetos controlados
vão de colas a chips e softwares.
"Depois do 11 de Setembro,
essa lei tem sido aplicada de
forma indiscriminada", afirma
Stefani, da Opto.
Ricardo Cartaxo, diretor do
programa CBERS, diz que os
dois primeiros satélites da série
(desenvolvidos na década de
1990) não sofreram embargo.
"Usávamos um componente
feito por uma empresa americana subsidiária da Fujitsu japonesa, mas não conseguimos
[comprá-lo agora]. Tivemos de
mudar o projeto para utilizar
uma parte já montada feita por
uma empresa francesa."
Atraso
Segundo Cartaxo, o risco de o
CBERS-3 sofrer atraso é iminente. "Um lote de componentes está sendo comprado agora.
Fizemos a escolha dos fornecedores alternativos e vamos
manter o cronograma", diz. "A
aposta é que dá para manter o
lançamento em abril de 2010,
mas não está fácil, não."
Segundo Fernando Ramos,
assessor de Cooperação Internacional do Inpe, a ameaça de
militarização do espaço pela
administração Bush contribui
para agravar as restrições. "Isso
tem ocasionado problemas para o Brasil, sim, sobretudo depois daquele ensaio que os chineses fizeram [em janeiro de
2007] e destruíram um satélite
antigo deles em órbita", disse.
"Os EUA apertaram o cerco à
China e aos seus parceiros."
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