São Paulo, sábado, 23 de abril de 2005

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ARQUEOLOGIA

Estudo de artefatos com infravermelho permite leitura de material desconhecido em papiros da Antigüidade

Técnica resgata textos perdidos da Grécia

Universidade de Oxford/Egypt Exploration Society
Fragmentos de manuscritos, de Heródoto (esquerda), o homem que cunhou o termo "história", e do poeta grego Arquíloco, ambos descobertos em Oxyrhynchus

DAVID KEYS
NICHOLAS PYKE
DO "INDEPENDENT"

Por mais de um século, ela causou empolgação e frustração em igual medida: uma coleção de escritos gregos e romanos tão vasta que poderia redesenhar o mapa da civilização clássica. Que bom seria se fosse legível.
Agora, num avanço descrito como o equivalente clássico de encontrar o cálice sagrado, cientistas da Universidade de Oxford, no Reino Unido, empregaram tecnologia de infravermelho para revelar os tesouros dos papiros de Oxyrhynchus e com isso abrir a perspectiva de que centenas de comédias, tragédias e poemas épicos gregos sejam finalmente revelados em breve.
Só ao longo das últimas duas semanas, os estudiosos de Oxford os usaram para fazer uma série de descobertas estonteantes, incluindo textos de Sófocles, Eurípedes, Hesíodo e outros gigantes literários do mundo antigo, perdidos por milênios. Eles até acreditam que irão encontrar evangelhos cristãos perdidos, originais escritos na mesma época em que os livros mais antigos do Novo Testamento foram redigidos.
Os papiros originais, descobertos num depósito de lixo no Egito central, são muitas vezes insignificantes a olho nu -decompostos, comidos por vermes e fortemente escurecidos pela passagem do tempo. Mas cientistas usando uma nova técnica fotográfica, desenvolvida originalmente para imagens de satélite, estão trazendo os antigos escritos de volta.
Os acadêmicos acreditam que o desenvolvimento pode levar a um aumento de 20% no número de trabalhos gregos e romanos conhecidos. Alguns estão até prevendo o surgimento de uma "segunda Renascença".

Sorte grande
Christopher Pelling, professor régio de grego na Universidade de Oxford, descreveu os novos trabalhos como "textos fundamentais sobre os quais acadêmicos têm especulado durante séculos".
Richard Janko, um famoso acadêmico britânico, antes no University College de Londres, agora chefe de departamento na Universidade de Michigan (Estados Unidos), disse: "Normalmente, temos a sorte de achar um desses por década". Uma descoberta em particular, uma passagem de 30 linhas do poeta Arquíloco, de quem apenas 500 linhas sobreviveram no total, é descrita como "valiosa" por Peter Jones, autor e co-fundador da campanha Amigos dos Clássicos.
Os fragmentos de papiros foram descobertos na cidade greco-egípcia de Oxyrhynchus ("cidade do peixe de ponta afiada"), no Egito central, no final do século 19. Contendo 400 mil fragmentos, guardados em 800 caixas na Biblioteca Sacker, de Oxford, é o maior tesouro de manuscritos clássicos no mundo.

Poemas e tragédias
Os textos antes desconhecidos, lidos pela primeira vez na semana passada, incluem partes de uma tragédia há muito perdida -a "Epígonoi" ("Descendentes"), escrita por Sófocles -dramaturgo mais famoso por sua tragédia "Édipo Rei"-, no século 5º a.C; parte de um romance perdido do escritor grego Luciano, do século 2 d.C.; material desconhecido de Eurípedes; poesia mitológica do poeta grego do século 1º a.C. Partênio; trabalho do poeta Hesíodo, do século 7 a.C.; um poema épico de Arquíloco, um sucessor de Homero pertencente ao século 7º a.C., que descreveu os eventos que levaram à Guerra de Tróia. Materiais adicionais de Hesíodo, Eurípedes e Sófocles quase com certeza ainda serão descobertos.
Os acadêmicos de Oxford estão trabalhando lado a lado com especialistas de infravermelho da Universidade Brigham Young, em Utah (EUA). Sua operação deve aumentar o número de trabalhos literários parcial ou totalmente recuperados do mundo grego antigo em um quinto. Poderia facilmente dobrar o corpo de trabalhos menores -os livros populares e as comédias de situação daquela época.
A técnica criada pelos pesquisadores para revelar o conteúdo dos papiros foi desenvolvida a partir de tecnologias de satélite. Os fragmentos, preservados entre camadas de vidro, são visualizados na freqüência do infravermelho -a tinta que é invisível a olho nu, nessas freqüências, é visível e pode ser fotografada.
Os fragmentos formam parte de um gigantesco quebra-cabeças que precisa ser remontado. As "peças" faltantes podem ser fornecidas por citações de autores posteriores e por detalhadas análises gramáticas.


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