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Brasil tratará silicose com célula-tronco
Doença foi barrada com sucesso em experimentos com roedores; estudo será apresentado hoje por grupo do Rio de Janeiro
Síndrome pulmonar atinge 6 milhões de pessoas no país; entre as vítimas estão trabalhadores da indústria naval, mineiros e vidraceiros
EDUARDO GERAQUE
ENVIADO ESPECIAL A ÁGUAS DE LINDÓIA
A silicose será a primeira
doença pulmonar tratada com
células-tronco adultas no Brasil. O anúncio do estudo clínico
pioneiro será feito hoje em
Águas de Lindóia (SP), durante
a 23ª Reunião Anual da Fesbe
(Federação de Sociedades de
Biologia Experimental).
Em pesquisas com roedores,
já concluídas, a equipe do professor Marcelo Morales, da
UFRJ (Universidade Federal
do Rio de Janeiro), conseguiu
barrar com sucesso o desenvolvimento da doença. A silicose,
inflamação no pulmão deflagrada pelo contato com o pó de
sílica, atinge 6 milhões de pessoas no Brasil.
A maioria dos pacientes são
trabalhadores da indústria naval. Mineiros, artistas plásticos
e vidraceiros também podem
desenvolver a inflamação -que
não tem cura nem tratamento e
mata o indivíduo em cerca de
30 anos, forçando antes disso
aposentadoria por invalidez.
Dez pacientes -ainda a serem escolhidos- serão tratados com as suas próprias células-tronco da medula óssea.
"Elas são retiradas por meio de
uma punção normal e instiladas [injetadas em forma líquida] diretamente nas vias aéreas
[dos doentes]", disse Morales à
Folha. Do ponto de vista fisiológico, segundo o pesquisador
da UFRJ, as células-tronco da
medula conseguem retardar o
processo inflamatório causado
pelo finíssimo pó de sílica.
A silicose não tem cura porque é impossível retirar a sílica
dos pulmões. Com isso, os macrófagos [células do sistema de
defesa do corpo humano] dos
alvéolos pulmonares entram
em ação e liberam uma série de
enzimas. "Esse processo destrói outros macrófagos, iniciando uma reação em cadeia
irreversível que forma fibromas no pulmão", disse o pesquisador da UFRJ.
Nos testes já feitos em laboratório, as células-tronco retiradas da medula óssea conseguiram diminuir exatamente a
atividade dos macrófagos, fazendo com que a fibrose diminuísse. "Nos nossos testes, todos os parâmetros pulmonares
dos animais melhoraram."
A expectativa do grupo é que
o mesmo ocorra agora no tratamento que será feito em seres
humanos. Porém, nessa primeira fase dos testes, o único
item medido será a segurança.
Cada paciente será acompanhado por um ano. Na chamada
fase clínica 2 será analisada a
eficiência do método.
A silicose, que foi a primeira
inflamação pulmonar escolhida exatamente por ser uma
doença sem tratamento e que
atinge muitas pessoas no país,
não é a única linha de pesquisa
do grupo. Eles já investigam o
uso de células-tronco adultas
para outras doenças. "Em animais, estamos estudando o
mesmo procedimento para asma, enfisema e doenças obstrutivas crônicas geradas pelo tabaco", afirmou Morales. "Em
todos os casos, até agora, o resultado tem sido positivo."
Mecanismo desconhecido
Ao mesmo tempo em que
aplicam a técnica com células-tronco que já mostrou dar resultados clínicos, os pesquisadores tentam ainda entender
melhor como o processo celular básico envolvido com a freada na inflamação pulmonar está ocorrendo.
"Uma das nossas linhas de
ação é tentar separar os grupos
de células-tronco retiradas da
medula e ver quais estão realmente agindo no pulmão. Hoje
são instiladas as células-tronco
totais", disse Morales.
Com um melhor domínio da
pesquisa básica, esperam os
cientistas, será mais fácil melhorar o rendimento da técnica
clínica. "Tem muito estudo a
ser feito ainda."
O repórter se hospedou em Águas de Lindóia a
convite da Fesbe
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